8. CONTRADIÇÕES APARENTES


Muitos escritores reformados afirmam que há uma “antinomia”, paradoxo ou assim chamada “contradição aparente” entre a soberania divina e a responsabilidade humana. Eu discordo — não há tal contradição aparente. Por exemplo, Packer comete esse engano em seu livro sobre evangelismo. Como Lutero aponta em O Cativeiro da Vontade, as pessoas fabricam contradições onde não há nenhuma. Chamá-la de “contradição aparente” não a torna melhor se ela é, antes de tudo, imaginária. Os escritores reformados deveriam ser mais cuidadosos sobre isso.

É realmente possível que duas proposições possam parecer contraditórias para uma pessoa quando elas de fato não são logicamente contraditórias. O problema, então, está com a pessoa e não com as proposições. Talvez ela tenha cometido um engano no raciocínio, ou talvez lhe falte alguma informação para entender corretamente as proposições.

Contudo, eu sustento que (e esse é o ponto impopular), enquanto duas proposições parecerem contraditórias a uma pessoa (seja elas ou não logicamente contraditórias), ela não pode verdadeiramente afirmar ambas as proposições. Isso porque, para duas proposições serem contraditórias (seja na aparência ou na realidade), necessariamente significa que afirmar uma é ao mesmo tempo negar outra. Portanto, afirmar duas proposições contraditórias é realmente negar ambas na ordem reversa.

Isto é, se X e Y são contraditórios, então X=não-Y é Y=não-X. Então, afirmar tanto X como Y é o mesmo que afirmar não-Y e não-X, o que negaria tanto X como Y, só que na ordem reversa. Certamente, visto que não-Y=X é não-X=Y, então isso significa que negar tanto X como Y é realmente afirmar ambos na ordem reversa. Mas, novamente, afirmar ambos é negar ambos na ordem reversa, e assim por diante – ad infinitum. Portanto, afirmar duas proposições contraditórias (sejam contraditórias em aparência ou na realidade) é não dizer nada, ou pior do que nada.

Eu concordo que quando uma pessoa vê duas proposições na Escritura que lhe parecem contradizer uma a outra ela deve crer que a contradição está somente em sua própria mente, e que as proposições parecem se contradizer somente por causa da sua própria falta de entendimento ou do seu raciocínio falacioso, e que não há uma contradição lógica real. Eu ainda diria que, até onde as duas proposições lhe parecerem contraditórias, ela ainda não poderá verdadeiramente afirmar ambas ao mesmo tempo.

Visto que a Escritura realmente não se contradiz, isso é apenas outra forma de dizer que uma pessoa não pode verdadeiramente afirmar uma proposição até que ela entenda verdadeiramente e corretamente o que a proposição significa. Ou, uma pessoa não pode afirmar verdadeiramente uma parte da Escritura que ela não entenda verdadeira e corretamente. Se ela não entende o que a proposição significa, então, seja o que for que ela esteja afirmando, não é realmente essa proposição, mas alguma outra proposição em sua mente. Minha posição sobre esse ponto é correta por necessidade. Opôr-se a ela seria sugerir que alguém pode afirmar uma proposição que nem mesmo entrou em sua mente, o que seria absurdo.

Em outras palavras, quando uma pessoa lê as proposições X e Y, mas entende mal pelo menos uma das proposições, de forma que sua mente perceba X e A, e se X e A se contradizem, embora X e Y não se contradigam, então, parecerá para a pessoa que X e Y se contradizem, embora seja X e A que realmente se contradigam, visto que a pessoa pensa que ela está pensando sobre X e Y, quando na realidade está pensando sobre X e A.

Uma proposição bíblica mal-entendida torna-se uma proposição não-bíblica na mente de uma pessoa. Uma proposição bíblica pode certamente contradizer uma não-bíblica; ou, duas proposições não-bíblicas podem certamente se contradizer. Isso é o que realmente acontece quando uma pessoa vê uma “aparente contradição” na Escritura. Um ou ambos os lados da alegada contradição não é realmente uma proposição bíblica, pois ele tem sido distorcido ou mal-entendido.

Ou, uma pessoa pode entender corretamente as proposições X e Y, mas afirmar também alguma outra falsa premissa Q, que parece fazer com que X e Y se contradigam, quando, por si mesmas, elas não se contradigam.

Um exemplo é a relação entre soberania divina (X) e responsabilidade humana (Y). Por si mesmas, não há uma contradição entre as duas proposições, seja real ou aparente.[1] Contudo, as duas parecerão se contradizer uma vez que você impõe a premissa “responsabilidade pressupõe liberdade” (Q). De repente, parecerá que X contradiz Y. De fato, se Q é verdadeira, então haveria uma contradição real, e não somente uma “aparente”. Mas, uma vez que percebemos que Q é falsa, até mesmo a aparência de uma contradição desaparece. A chave, então, é entender corretamente o que a Escritura diz e evitar adicionar a ela ideias falsas que não vêm da Escritura de forma alguma.

Para sumarizar, se uma pessoa entende o que a Bíblia está dizendo em cada instância, automaticamente em nenhum momento duas proposições na Bíblia parecerão contraditórias para ela. Isso porque, na realidade, não há nenhum caso de duas proposições na Bíblia que se contradigam. Mas, se a pessoa nem sempre entende a Bíblia corretamente, então, em alguns casos, duas proposições podem parecer se contradizerem (mesmo quando elas realmente não se contradizem). Nesses casos, ela pode ainda “saber” que a contradição é somente “aparente”, visto que ambas as proposições são encontradas na Bíblia. Contudo, ela não pode afirmar ambas enquanto elas ainda lhe parecem contraditórias. O que ela deve fazer? Deve estudar para captar o verdadeiro significado de cada proposição, e, quando isso acontecer, ela verá, antes de tudo, que a contradição nunca existiu.

Falhando em entender e reconhecer o exposto acima, os cristãos estão frequentemente, e rapidamente também, gritando “Mistério!” e “Paradoxo!” quando confrontados com proposições bíblicas que são obviamente não-contraditórias, a menos que sejam feitas contraditórias por alguma distorção espetacular ou por alguma suposição estranha extrabíblica. Isso não é um sinal de reverência genuína. Isso é de fato uma negação implícita da clareza e da unidade da Escritura, e um tremendo insulto à sabedoria e integridade de Deus, que inspirou a Escritura para nós a entendermos, crermos e obedecermos. À luz disso, parece quase trivial mencionar que esse ilegítimo apelo ao “mistério” e “paradoxo” também concede desnecessariamente munição para os inimigos da fé.

Assim, se desejamos verdadeiramente honrar a grandeza de Deus, devemos ousada e reverentemente afirmar que a Escritura é clara, e claramente não-contraditória em todo aspecto.

– Vincent Cheung

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NOTA:
1 – “
Não há contradição entre soberania divina e responsabilidade humana. Ao contrário, a soberania divina e a responsabilidade humana são irmãs inseparáveis”. – JP Padilha

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