9. A “OFERTA SINCERA” DO EVANGELHO - O mito de que Deus ama todo mundo


A doutrina em questão tem sido chamada de “a livre oferta”, “a oferta bem intencionada” e “a oferta sincera” do evangelho.[1] Minha posição é que ela faz de Deus um tolo esquizofrênico. Ela é antibíblica e irracional, e, assim, deve ser rejeitada e combatida. “Não existe um versículo sequer na Bíblia dizendo que Deus ama a todos os indivíduos do mundo, sem exceção. Portanto, pregar o evangelho dizendo “Deus te ama” é uma das maiores heresias da história do Cristianismo. Nós não vemos os apóstolos dizendo essa frase nas epístolas porque ela simplesmente é falsa”.[2]

Primeiro, nós não sabemos de antemão quem estão contados entre os eleitos e os não-eleitos, e já que a Escritura nos ordena a pregar a toda pessoa, não devemos tentar determinar por nós mesmos quem são os eleitos e os não-eleitos, e, então, pregar o evangelho somente àqueles a quem consideramos os eleitos. Antes, devemos pregar indiscriminadamente o evangelho a todos os homens.

Por outro lado, é errado e pecaminoso pregar o evangelho como se houvesse uma chance até mesmo para os não-eleitos obterem fé e serem salvos, como se Deus estivesse sinceramente lhes dizendo que Ele deseja sua salvação e que eles podem ser salvos (Lucas 10:21; João 6:65). Não conhecemos o conteúdo preciso do decreto de Deus na eleição (no que diz respeito a quem são os eleitos e quem são os não-eleitos), de forma que não devemos agir como se o conhecêssemos. Contudo, isso não significa que devamos falar como se a eleição fosse falsa quando pregamos o evangelho.

Pelo contrário, em nossa mensagem, devemos deixar claro que Deus ordena seriamente que toda pessoa, seja eleita ou não-eleita, creia no evangelho, fazendo assim toda pessoa moralmente obrigada a crer –– aqueles que assim o fizerem serão salvos e aqueles que não o fizerem serão condenados. Mas, não devemos apresentar isso como uma “oferta sincera” de salvação da parte de Deus para os não-eleitos.

A fé vem somente como um dom soberano de Deus, e Deus decidiu imutavelmente reter este dom dos não-eleitos e os endurecer ativamente. Portanto, oferecer sinceramente a salvação aos não-eleitos, como se Deus desejasse que eles fossem salvos e como se fosse possível para eles serem salvos, seria mentir para eles em nome de Deus. Não há uma oferta real ou sincera de salvação aos não-eleitos, mas somente uma ordem séria e real que eles nunca podem obedecer, e que Deus imporá contra eles com o lago de fogo e enxofre.

Novamente, isso não nos impede de pregar indiscriminadamente o evangelho a todos os homens, visto que não é o nosso direito nem o nosso dever escolher os eleitos e pregar somente a eles, ou escolher os não-eleitos e excluí-los. O ponto é que não devemos apresentar o evangelho como uma oferta sincera de forma alguma, como se o “desejo” de Deus pudesse diferir do Seu decreto, como se Deus pudesse decretar ou tivesse decretado contra o Seu “desejo”[3] (quando a Escritura ensina que Ele decreta o que Ele deseja –– isto é, seu “bom propósito” –– e, o que Ele deseja, Ele decreta e faz certo), e como se fosse possível para os não-eleitos serem salvos. Antes, devemos apresentar o evangelho como uma ordem séria a todos e como se fosse requerido de todos o crer (Atos 17:30), e como se Deus intentasse chamar os eleitos e endurecer os não-eleitos pela mesma pregação do evangelho (2 Coríntios 2:15-16).

Em outras palavras, o conteúdo e a pregação do evangelho podem e devem ser completamente consistentes com as doutrinas da eleição e da reprovação, bem como com todas as outras doutrinas relacionadas. Para muitos, afirmar a “oferta sincera” é meramente uma escusa para crer como um calvinista, mas pregar como um arminiano.

Segue-se que, quando pregando o evangelho, não deveríamos dizer aos nossos ouvintes que Deus ama a todos eles igualmente ou no mesmo sentido, nem deveríamos hesitar em declarar que Deus ama somente os eleitos e deseja (e, portanto, decretou) sua salvação, e que Ele odeia os réprobos e deseja (e, portanto, decretou) sua condenação (Romanos 9:13).

À luz disso, deixe-me sumarizar o entendimento e a atitude bíblica para com o evangelismo.

Somos obrigados a pregar indiscriminadamente o evangelho a todos os homens por pelo menos três razões: 1. Deus nos manda pregar o evangelho a todas as pessoas; 2. Não sabemos e não deveríamos tentar descobrir de antemão quem são os eleitos e quem são os réprobos; e 3. O propósito da pregação do evangelho não é somente chamar os eleitos, mas também endurecer os réprobos.

É certo e apropriado anunciar que Deus deseja salvar somente os eleitos e escolheu somente eles para salvação, e que Ele concederá fé somente a eles, de forma que somente eles podem crer. E é certo e apropriado anunciar que Deus deseja condenar os réprobos e os escolheu para condenação, e que Ele não somente reterá a fé deles,[4] mas que Ele também ativamente endurecerá suas mentes contra o evangelho, fazendo impossível para eles o crer no evangelho (o verdadeiro evangelho).

Assim como não devemos e nem podemos descobrir de antemão quem são os eleitos e quem são os réprobos, nem devem nossos ouvintes tentar determinar por si mesmos se eles estão entre os eleitos ou entre os réprobos, devemos, ao mesmo tempo, fazer disso a base do evangelismo e ensinar nossos ouvintes a clamar a Deus por salvação. Em outras palavras, ao ouvir o evangelho, ninguém deve dizer para si mesmo: “Deus salva somente os eleitos, e eu provavelmente estou entre os réprobos de qualquer jeito. Assim, eu não devo nem mesmo tentar buscar a Deus para salvação”. Agora, alguém que, com teimosia, pensa dessa forma, mesmo quando confrontado com uma clara explanação do evangelho da graça soberana, pode ser realmente um dos réprobos, e Deus escolheu confirmar essa pessoa em sua condenação por meio dessa persistente decepção.

Ao invés de camuflar ou representar injustamente o decreto eterno de Deus aos nossos ouvintes, quando pregando o evangelho, deveríamos explicar-lhes as verdades que têm relevância imediata com respeito ao pecado e a graça, e com respeito à eleição e a reprovação. Todavia, mais do que isso, deveríamos apresentar-lhes o inteiro sistema de doutrinas bíblicas, tão claramente e compreensivamente como podemos manejar e como o tempo permitir (Atos 17:23-31; Mateus 28:19-20; Lucas 14:27-33). Então, devemos admoestar nossos ouvintes para sincera e fervorosamente buscar a Deus para salvação, através de Cristo, pelos meios da graça, tais como oração, sermões e leitura da Bíblia.

Visto que seria impossível sinceramente buscar ou clamar a Deus, a menos que Seu poder já esteja operando dentro do coração de uma pessoa, aqueles que deveras obedecem e invocam a Deus sinceramente para lhes salvar através de Cristo certamente estão entre os eleitos, em quem Deus já começou Sua obra soberana de conversão. Mas aqueles que insinceramente ou superficialmente obedecem, e aqueles que, após um pouco de tempo apostatam, ou aqueles que rejeitam obedecer de qualquer forma, estão entre os não-eleitos, cujas mentes Deus endureceu ainda mais pela pregação do evangelho (2 Coríntios 2:15-16; 2 Tessalonicenses 1:8).

Portanto, ao rejeitar a assim-chamada “oferta sincera” do evangelho, a pregação do evangelho não é nem diminuída nem tornada estreita e seletiva. Pelo contrário, o acima exposto é uma aplicação consistente e necessária dos ensinos explícitos e implícitos da Escritura com respeito à soberania de Deus, à eleição e reprovação, e à pregação do evangelho. É uma visão bíblica e coerente que valoriza a pregação do evangelho e deveras a propagação do inteiro sistema de doutrinas bíblicas a todos os homens em todo lugar. Além do mais, ela reconhece o que a Escritura explicitamente ensina sobre o propósito e o efeito da pregação indiscriminada do evangelho, isto é, chamar os eleitos e endurecer os réprobos.[5]

– Vincent Cheung
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NOTAS:
1 – Comentário de JP Padilha na introdução do artigo.

2 –
Esses termos não são sempre usados consistentemente ou com precisão, de forma que eles representam uma considerável abrangência de significados. É verdade também que nem todos os que negam a “oferta sincera” crêem exatamente nas mesmas coisas. Portanto, aqueles que afirmam a “oferta sincera” podem se encontrar concordando comigo em alguns pontos, enquanto outros que afirmam a “oferta sincera” podem discordar daqueles mesmos pontos. Da mesma forma, nem tudo o que eu disse sobre ou contra a “oferta sincera” se aplica igualmente a todos os que afirmam o ensino. Em adição, aqueles que afirmam a “oferta sincera” são frequentemente inconsistentes em sua linguagem. Por exemplo, alguém pode estar denunciando aqueles que negam a “oferta sincera”, e então começar a falar sobre o assunto como dizendo respeito a uma “ordem”, como se uma oferta e uma ordem fossem a mesma coisa, quando elas não o são de forma alguma. Essas inconsistências fazem uma discussão precisa sobre o assunto muito difícil. Outra razão para confusão é que aqueles que afirmam a “oferta sincera” frequentemente fazem suposições injustificadas sobre aqueles que a negam. Por exemplo, alguns daqueles que afirmam a “oferta sincera” assumem que aqueles que a negam se oporiam necessariamente à pregação do evangelho de uma forma indiscriminada a todos os homens. Mas isso não é verdade –– aqueles que negam a “oferta sincera” ainda podem pregar indiscriminadamente o evangelho a todos os homens, mas eles o fazem por uma razão diferente e baseados num entendimento diferente da situação. Assim, a melhor maneira de se beneficiar da nossa breve discussão é considerar as reais crenças com as quais estou tratando, seja em minhas afirmações ou negações, e não necessariamente como o termo é usado num caso particular ou por uma pessoa particular. Por exemplo, você pode ser alguém que afirme a “oferta sincera”, mas você pode achar que estou tratando do assunto exatamente como você crê. Em tais circunstâncias, é melhor considerar as próprias crenças com as quais estou tratando ao invés de considerá-las como parte necessária do que alguém que afirma a “oferta sincera” deva crer.

3 – A Escritura ensina que Deus decreta o que Ele deseja – isto é, Sua “boa vontade” – e o que Ele deseja, Ele decreta e faz certo. Dabney tenta preservar a “oferta sincera” afirmando que há motivos complexos em Deus, de forma que, embora Deus possa genuinamente desejar a salvação dos não-eleitos de uma perspectiva, outro motivo ou razão nEle o afasta de tal desejo, e este é o porquê Ele não escolhe salvar os não-eleitos. Parece para Dabney que essa explicação preserva tanto sua crença na divina eleição de somente alguns para salvação e o desejo genuíno de Deus de salvar a todos em algum sentido. Contudo, mesmo se aceitarmos o que Dabney diz sobre os motivos complexos em Deus, no ponto do decreto divino de somente alguns para salvação e então no ponto da pregação do evangelho, o motivo mais forte para selecionar somente alguns para salvação afastou o desejo genuíno de salvar a todos (isto é, assumindo que esse desejo sequer existiu alguma vez), de forma que nem o decreto divino nem a pregação do evangelho não mais expressam ou permitem expressar qualquer desejo em Deus de salvar a todos. Em outras palavras, mesmo que os motivos de Deus sejam complexos, o decreto e a pregação não são complexos, mas o decreto e a pregação são precisamente o que estamos falando. Portanto, mesmo que Dabney esteja correto sobre os motivos complexos em Deus, eles são irrelevantes para a nossa discussão.

4 – Nota do tradutor: No sentido de não lhes conceder a fé, posto que a fé é um dom soberano de Deus.

5 – Veja David Engelsma, Hyper-Calvinism and the Call of the Gospel e Common Grace Revisited para mais sobre o assunto.

Entenda melhor sobre o tema clicando nos links abaixo:

Deus ama todo o mundo? – Desvendando o mito | JP Padilha
https://jppadilhabiblia.blogspot.com/2019/08/deus-ama-todo-o-mundo-desvendando-o-mito.html

O significado de "Mundo" na Bíblia | JP Padilha
https://jppadilhabiblia.blogspot.com/2019/07/o-significado-de-mundo-na-biblia-jp.html

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