CAPÍTULO 4 – A DOUTRINA ACERCA DO ESPÍRITO SANTO (Pneumatologia)



“Cremos (...) no Espírito Santo, Senhor e vivificador, que procede do Pai, que com o Pai e o Filho conjuntamente é adorado e glorificado, que falou através dos profetas”. – Credo Niceno-Constantinopolitano

INTRODUÇÃO

A doutrina acerca do Espírito Santo talvez seja uma das áreas mais debatidas da teologia cristã, sendo também o campo em que, na prática, a igreja tem cometido seus maiores erros e excessos. Definições confusas e obscuras, interpretações bíblicas intuitivas, valorização da experiência mais do que do testemunho bíblico, apego a costumes e tradições, tudo isso tem contribuído para a construção de uma pneumatologia defeituosa, bem distante do ensino apostólico.

Obviamente, os desvios nessa área têm gerado consequências desastrosas, tanto para a vida pessoal dos crentes, como para as igrejas locais na realização de seus atos de adoração, serviço e proclamação, o que impõe a necessidade de estudo mais sério e de francas correções.

O material que segue visa atender um pouco a essa necessidade, protegendo o estudante da Bíblia dos desvios tão comuns com que o povo de Deus se depara quando ouve falar sobre a pessoa e obra do Espírito Santo. Neste capítulo, o cristão encontrará também ferramentas para desenvolver uma pneumatologia sadia e propagá-la a seus irmãos de fé.

A PERSONALIDADE DO ESPÍRITO SANTO

O Espírito Santo não é uma força impessoal, conforme dizem algumas seitas. Ele tem personalidade, ou seja, tem inteligência (Rm 8.27; 1Co 2.10-11), emoções (Is 63.10; Ef 4.30) e vontade (1Co 12.11).

Há outros fatores que demonstram a personalidade do Espírito:

1. É possível blasfemar contra ele (Mt 12.31-32).
2. Ele ensina os crentes (Jo 14.26).
3. É possível mentir para ele (At 5.3).
4. Ele guia os crentes (Rm 8.14).
5. Ele testifica aos crentes (Rm 8.16).
6. Ele intercede pelos crentes (Rm 8.26).
7. Ele fala aos crentes (Ap 2.7).

IMPORTANTE!
A blasfêmia contra o Espírito Santo, também conhecida como o pecado imperdoável, consistia de ser testemunha ocular de uma obra realizada por Cristo durante seu ministério neste mundo e atribuir esta obra ao diabo (Mt 12.22-32). Desde a ascensão do Senhor, quando ele deixou de estar fisicamente presente aqui, esse pecado se tornou impossível de ser cometido.

Os itens dessa lista mostram os diferentes aspectos próprios da personalidade do Espírito Santo. Suas emoções e intelecto se expressam, por exemplo, quando ele se entristece. Sua intercessão em favor dos crentes é evidência de sensibilidade (emoções) e vontade. Sua atividade de ensinar, guiar, falar e distribuir dons aos crentes demonstra que ele tem vontade e inteligência. Note-se ainda que a possibilidade de uma pessoa mentir e blasfemar contra ele mostra que o Espírito não é algo, mas alguém!

A doutrina da personalidade do Espírito Santo é de importância vital. Sua negação implica, entre outras coisas, a rejeição da divindade do Espírito e, consequentemente, a negação da doutrina da Trindade.

A DIVINDADE DO ESPÍRITO SANTO

A Bíblia ensina que o Espírito Santo é divino, sendo uma das pessoas da Trindade. As provas bíblicas da divindade do Espírito são as seguintes:

1. Ele é chamado como Deus (At 5.3-4; 2Co 3.17).
2. Ele tem atributos divinos:

Eternidade (Hb 9.14).
Onipresença (Sl 139.7-10).
Onipotência (Lc 1.35).
Onisciência (1Co 2.10-11).

3. Ele realiza obras divinas:

Criação (Gn 1.2; Jó 33.4).
Transmissão de vida (Rm 8.11).
Autoria da profecia divina (2Pe 1.20-21).

4. Ele é identificado como Deus (Is 6.8-10 cp. At 28.25-27).
5. Ele tem o seu nome associado ao nome do Pai e do Filho (Mt 28.19; 2Co 13.13 [ou v. 14 – NVI]).

IMPORTANTE!
É preciso destacar que, na Trindade, enquanto o Filho é eternamente gerado (Jo 1.14,18), o Espírito Santo não é gerado, mas procede do Pai (Jo 15.26). O Terceiro Concílio de Toledo (589) acrescentou a cláusula filioque ao texto em latim do Credo Niceno, afirmando que o Espírito também procede do Filho (Filioque significa “e do Filho”). Mas isso gerou críticas dos teólogos orientais que rejeitaram o acréscimo. Ao que parece, o correto é afirmar que o Espírito, como ser divino, procede substancialmente do Pai que é a única “fonte” das demais pessoas da Trindade. Porém, ele procede do Pai e do Filho em seu envio ao mundo para ministrar como consolador (Jo 14.16; 16.7).

O modo como o Espírito Santo é chamado nas Escrituras também demonstra sua personalidade e divindade. Veja-se o quadro a seguir:

Espírito de vosso Pai – Mateus 10.20.
Espírito de Deus – Mateus 12.28.
Espírito do Deus vivo – 2 Coríntios 3.3.
Espírito do Senhor – Lucas 4.18; Atos 5.9.
Espírito da verdade – João 14.17; 15.26; 16.13.
Espírito de Cristo – Romanos 8.9; 1 Pedro 1.11.
Espírito de Jesus – Atos 16.7.
Espírito de Jesus Cristo – Filipenses 1.19.
Espírito de seu Filho – Gálatas 4.6.
Espírito Santo da promessa – Efésios 1.13.
Espírito que provém de Deus – 1 Coríntios 2.12.
Espírito eterno – Hebreus 9.14.
Espírito da graça – Hebreus 10.29.
Espírito que em nós habita – Tiago 4.5.
Espírito da glória e de Deus – 1 Pedro 4.14.
Espírito de sabedoria, entendimento, conselho, poder, conhecimento e temor do Senhor – Isaías 11.2.
Senhor – 2 Coríntios 3.18.
Consolador – João 14.26; 15.26.

A OBRA DO ESPÍRITO SANTO NOS CRENTES

A Bíblia apresenta a obra do Espírito Santo nos crentes sob diferentes aspectos, a saber:

Regeneração. Regenerar significa gerar novamente. Para que alguém se torne filho de Deus (Jo 1.12) é necessário que nasça de novo, sendo gerado pelo Espírito Santo (Jo 3.3-6). A regeneração é necessária porque o homem, desde a Queda, é totalmente depravado e, por isso, não lhe basta uma reforma. Ele precisa ser feito uma nova criatura (2Co 5.17).

Batismo. Conforme se depreende de 1 Coríntios 12.12-13, o batismo do Espírito Santo é, basicamente, a inserção da pessoa no corpo místico de Cristo que é a igreja. A Bíblia diz que é o próprio Cristo quem realiza esse batismo (Jo 1.33). Isso ocorre no momento da conversão da pessoa. Assim, o crente não precisa buscar o batismo do Espírito Santo, pois já o recebeu quando creu em Cristo como seu salvador (Rm 8.9). É preciso dizer ainda que a ideia de que o batismo do Espírito Santo deve ser acompanhado do falar em línguas é fantasiosa. Em Corinto, todos eram batizados no Espírito (1Co 12.13), mas nem todos falavam em outras línguas (1Co 12.30).

IMPORTANTE!
A noção de que um eventual batismo espiritual acompanhado de línguas deve ser buscado com jejuns, vigílias e orações é estranha ao NT. Ninguém na Bíblia jamais foi batizado pelo Espírito ou falou em línguas após uma busca incessante. Todos que receberam essas dádivas sequer sabiam que elas existiam e jamais as pediram, buscaram ou se esforçaram por alcança-las (At 2.1-4; 8.14-17; 10.44-46; 19.5-6).

Habitação. Também a partir do momento da conversão, o Espírito Santo passa a habitar permanentemente no crente, seja qual for o nível de seu crescimento ou maturidade (At 19.1-2; 1Co 6.19). Essa realidade confere ao crente segurança e paz (Rm 8.14-16). Ademais, de acordo com Paulo, a habitação do Espírito transforma o corpo do crente num templo santo, devendo o cristão, por isso, evitar fazer uso pecaminoso dos seus membros (1Co 6.15-20). Ao que tudo indica, a habitação permanente do Espírito não era privilégio dado aos santos do AT (1Sm 16.13-14; Sl 51.11). Por outro lado, Pedro parece dizer que o Espírito estava nos profetas de forma constante (1Pe 1.11). Seja como for, João ensina que uma mudança ocorreu em algum aspecto na forma como o Espírito passou a ser dado aos crentes depois que o Senhor foi glorificado (Jo 7.38-39. Vd. Tb. Cl 1.26-27).

IMPORTANTE!
É a habitação do Espírito Santo que dá poder ao crente para ser uma testemunha eficaz de Jesus (At 1.8; 1Pe 1.12).

Selo. Relacionado à doutrina da habitação permanente do Espírito Santo no crente, há o ensino bíblico do selo do Espírito (Ef 1.13-14). De acordo com esse ensino, o Espírito Santo atua como um selo de propriedade de Deus no crente, a partir da sua conversão. Esse selo permanecerá em cada cristão até o dia em que o Senhor vier resgatar sua propriedade. Trata-se, portanto, de um penhor ou garantia de que Deus completará a obra de salvação que começou em cada cristão. A doutrina do selo do Espírito é, assim, uma das mais claras evidências de que o crente não pode perder sua salvação.

Plenitude. A plenitude do Espírito Santo diz respeito ao controle que o Espírito deve exercer sobre a vida do crente. Na Bíblia é possível observar dois tipos distintos de plenitude espiritual. Há a plenitude ocasional, experimentada somente por alguns instantes, em ocasiões específicas ou para fins determinados (At 4.8,31), e a plenitude vivencial que aponta para um estilo de vida em que a pessoa se deixa dominar pela influência do Espírito no seu dia a dia (Ef 5.18-20). Nesse segundo sentido em particular, estar cheio do Espírito deve ser o estado comum de cada cristão (At 6.3).

Fruto. O fruto do Espírito é o conjunto de virtudes que ele produz no crente (Gl 5.22-23). Os vários aspectos desse “fruto” são qualidades do caráter de Jesus desenvolvidas no cristão na medida em que ele se deixa controlar pelo Espírito Santo (Gl 5.16). Vê-se, assim, que o fruto do Espírito na vida de alguém é evidência clara e resultado óbvio de sua plenitude.

OS DONS DO ESPÍRITO SANTO

Os dons do Espírito Santo, seu significado e continuidade, estão entre os temas mais debatidos dentro do contexto evangélico. É nesse campo que ocorrem os maiores excessos na forma de agir de muitos crentes e é também por causa dessa discussão que terríveis divisões acontecem nas igrejas.

De tudo isso decorre a necessidade de entender bem o que são os dons do Espírito Santo, bem como seu propósito, duração e forma de funcionamento. De fato, a história já demonstrou satisfatoriamente que a má compreensão desses assuntos traz prejuízos desastrosos para o povo de Deus, precisamente num campo que deveria promover unidade e edificação (1Pe 4.10-11).

Os dons alistados na carta aos Romanos

Essa lista se encontra em Romanos 12.6-8 e é composta por sete itens.

Profecia: O profeta era alguém que recebia revelações diretas de Deus e as transmitia aos homens de forma inerrante e infalível. No NT, as revelações proféticas eram predominantemente doutrinárias, ou seja, os profetas revelavam verdades divinas ocultas de outras gerações. Essas verdades eram também chamadas de mistérios (Ef 3.4-5). Só mui raramente os profetas traziam revelações sobre o futuro ou sobre a vida particular de alguém e, ao que parece, só o faziam quando o que era revelado tinha forte impacto sobre a igreja como um todo (At 11.28; 21.10-11). Os profetas tinham como função primária lançar as bases doutrinárias, éticas e funcionais da igreja (Ef 2.20). Como essas bases foram todas lançadas nos tempos dos apóstolos, os profetas deixaram de existir já no fim do século I. O dom de profecia, portanto, não existe mais.

Serviço: É possível que esse dom abranja a habilidade dada por Deus de realizar bem aqueles trabalhos que são considerados inferiores pelas pessoas em geral. Nem todos são capazes de fazer esses serviços com qualidade. Por isso, Deus dotou alguns homens e mulheres da igreja com uma capacidade especial para realizar tarefas dessa natureza em favor dos santos.

Ensino: Trata-se da capacidade de transmitir a verdade de Deus à igreja com clareza e autoridade, promovendo sua edificação e amadurecimento. Por meio dos mestres, a igreja é protegida das falsas doutrinas e adquire base teológica para viver com retidão e santidade.

Exortação: Esse dom abrange o trabalho de consolar, animar e encorajar. Os cristãos geralmente são abalados não somente pelos problemas comuns da vida, mas também por ataques e dificuldades que lhes sobrevêm por causa da fé. Por isso, para que seu povo não fique à mercê do conselho de incrédulos, o Senhor concede esse dom a alguns crentes, a fim de que os santos encontrem neles amparo, alívio e amizade.

Contribuição: A referência aqui é à tarefa de distribuir. Sendo a igreja de Cristo formada por muitas pessoas pobres, há entre os santos aqueles cujo coração Deus dotou com a disposição constante de assistir os necessitados. Paulo diz que essas pessoas devem fazer isso generosamente. Outrossim, os crentes que têm esse dom devem se vigiar para que, no seu exercício, não sejam levados pelo desejo de ser admirados pelos homens (Mt 6.1).

Liderança: A prática desse dom envolve a administração de recursos da igreja e a direção geral da comunidade cristã local. A igreja não foi deixada por Deus à mercê das preferências de cada membro, pois isso a lançaria na desordem total (Jz 17.5-6). Antes, o Senhor lhe concedeu pessoas capazes de liderá-la, apontando seus alvos e o modo como devem ser atingidos. De acordo com Paulo, os líderes devem realizar seu trabalho com toda diligência, zelando para que seu dom não seja negligenciado.

“O Espírito Santo, que procede de Deus, quando é outorgado ao homem, inflama-o de amor por Deus e pelo próximo, sendo ele mesmo o Amor”. – Agostinho de Hipona

Misericórdia: A pessoa que tem esse dom se vê disposta a mostrar favor a seus irmãos que sofrem por causa de doenças, perdas, decepções e tragédias. Por se tratar de uma tarefa pesada e, às vezes, bastante desagradável, pode acontecer de algum crente ter esse dom e passar a exercê-lo com pesar. Por isso, Paulo diz que os irmãos que têm o dom de misericórdia devem exercê-lo com alegria.

Entre os dons alistados aqui somente o de profecia não existe mais. Com efeito, não há nenhum indício ou razão na Escritura para afirmar que os demais também deixaram de existir. Na verdade, o próprio viver diário da igreja mostra sua permanência viva até os dias de hoje.

Os dons alistados na primeira carta aos Coríntios

A Primeira Carta de Paulo aos Coríntios traz a maior lista de dons espirituais do Novo Testamento. São nove no total e se encontram em 1Coríntios 12.8-10. Em 1Coríntios 12.28 há outra pequena lista que repete em parte o que é alistado nos vv.8-10, além de mencionar alguns dons citados nas listas de Romanos e de Efésios.

Palavra de sabedoria: A pessoa que tem esse dom diz palavras de sabedoria divina em contraste com os indivíduos que promulgam filosofias vãs ou palavras de sabedoria humana (1Co 2.6-7,13; 3.19). Os temas centrais abordados por quem tem o dom da palavra de sabedoria são a graça de Deus (2Co 1.12) e, especialmente, a cruz de Cristo (1Co 1.17,23-24). Esse dom, portanto, é fundamental para quem exerce o trabalho de evangelismo (1Co 1.17; 2.1). Num sentido mais estrito, a palavra de sabedoria também abrange a revelação de mistérios doutrinários trazidos à luz no tempo do Novo Testamento pelos apóstolos (1Co 2.7-13). Nesse sentido estrito, a palavra de sabedoria não existe mais, permanecendo apenas a sua expressão geral, ou seja, a capacidade de interpretar a realidade à luz da graça e da cruz do Senhor, expondo isso verbalmente aos outros no evangelismo e no ensino da igreja.

Palavra de conhecimento: É difícil saber o que Paulo tinha em mente quando fez distinção entre a palavra de sabedoria e a palavra de conhecimento. Porém, parece correto que a palavra de conhecimento se relaciona ao modo como se deve agir na prática da vida cristã. Se for esse o caso, esse dom é útil para conduzir a igreja ao crescimento na compreensão da sã doutrina, a fim de fazê-la abandonar comportamentos imaturos ou errados (1Co 8.7; 15.33-34).

: Não se trata da fé salvadora, pois essa fé é um dom dado a todos os crentes (Ef 2.8). O dom da fé aqui mencionado é provavelmente uma convicção de origem sobrenatural de que Deus vai agir de forma especial numa determinada situação, quer por veículos naturais, quer por meios milagrosos (1Co 13.2). Essa confiança firme faz o crente agir como se o que espera estivesse prestes a se realizar (Hb 11.7-12). Não se deve confundir esse dom com mero otimismo ou com alguma forma de se autoiludir. O dom da fé é dado por Deus e gera uma surpreendente onda de confiança real no coração da pessoa.

Curas e operação de milagres: Os dons de curas eram capacidades dadas por Deus a alguns crentes de erradicar doenças, com o fim de servi-lo. O uso do plural (“dons de curar”) dá margem para formas diferentes de cura, o que pode abranger, além do milagre, o uso de meios naturais como remédios e cuidado médico. Já o dom de operação de milagres, conforme geralmente é entendido, consistia de realizar maravilhas fora da ordem natural das coisas. Parece certo dizer que o dom de curas, em sua expressão sobrenatural, era uma categoria mais específica do dom de operação de milagres que abrangia prodígios num sentido mais geral. Feitos sobrenaturais foram muito comuns na fase inaugural da igreja primitiva (At 5.15-16; 6.8; 8.13). Porém, em poucos anos essa fase começou a apresentar indícios de esfriamento (Fp 2.26-27; 1Tm 5.23; 2Tm 4.20). A razão disso é que as curas sobrenaturais e os milagres tinham por objetivo autenticar a mensagem nova que estava sendo pregada (Mc 16.20; At 14.3; 2Co 12.12; Hb 2.4), não havendo necessidade dessa autenticação se perpetuar. Por isso, não se vê hoje pessoas com dons de realizar curas ou feitos milagrosos. Isso, contudo, não significa que o Senhor, eventualmente, não faça obras grandiosas, além da compreensão humana. Antes, significa que quando Deus realiza feitos assim, ele o faz em resposta à oração dos crentes em geral e não por meio de indivíduos dotados por ele com capacitações sobrenaturais (Tg 5.14-18).

Profecias: Veja-se o que foi exposto no item anterior. Deve-se apenas acrescentar aqui que uma das responsabilidades da igreja no tocante aos profetas era avaliar o que eles diziam, comparando suas revelações com as verdades que o Senhor já havia transmitido (1Co 14.29). De fato, os profetas deveriam profetizar de acordo com a “proporção da fé” (Rm 12.6), ou seja, suas profecias deveriam se harmonizar com a doutrina cristã já fixada.

Discernimento de espíritos: Esse dom não consiste de descobrir os nomes ou as supostas áreas de atuação de demônios, como alguns tendem a crer. Antes, é a capacidade de discernir a origem de uma mensagem ou ensino, isto é, trata-se do dom de discernir o que realmente procede do Espírito Santo. Assim, o crente dotado desse dom detecta se o que está sendo dito (com todos os seus desdobramentos práticos) é de origem divina ou se é uma doutrina demoníaca (ou meramente humana) propagada por falsos mestres (1Tm 4.1-2; 1Jo 4.1-6). Não existe qualquer indício na Escritura ou na história do cristianismo que aponte para o desaparecimento desse dom, sendo vital a sua permanência na igreja cristã de todas as épocas.

Variedade de línguas e interpretação: O dom de línguas era a capacidade dada pelo Espírito Santo a alguns crentes de falar sobre as grandezas de Deus em um idioma humano jamais aprendido por quem falava (At 2.7-11). Ao definir esse dom, Paulo citou Isaías 28.11-12, identificando-o, assim, como um sinal de juízo contra judeus incrédulos que rejeitavam a mensagem de Deus (1Co 14.21-22). De fato, Deuteronômio 28.46,49 diz que ouvir uma língua desconhecida seria um sinal do juízo de Deus contra Israel sempre que esse povo rejeitasse sua mensagem (Jr 5.11-15). Ora, Israel rejeitou o Filho (At 7.51-53). Por isso, Deus usou a igreja para fazer com que os judeus daquela geração ouvissem línguas que não entendiam como sinal do juízo que estava por vir. Esse juízo foi predito por Jesus (Mt 23.37-39) e chegou no ano 70 AD por mãos do general romano Tito. Uma vez que o castigo contra Israel sinalizado pelas línguas ocorreu, esse dom deixou de ser necessário e desapareceu. Obviamente, o fim do dom de línguas trouxe também o fim do dom de interpretação.

Os dons alistados na carta aos Efésios

Esses dons designam, na verdade, funções dadas a algumas pessoas com vistas ao preparo dos crentes para o serviço de Deus, a fim de que a igreja seja edificada. A lista é pequena e se encontra em Efésios 4.11:

Apóstolo: Num sentido geral, o apóstolo era simplesmente um missionário pioneiro ou um mensageiro. Nesse sentido, Barnabé e Tiago, por exemplo, foram chamados de apóstolos (At 14.14; Gl 1.19). Num sentido técnico, porém, esse termo tinha abrangência bastante limitada, designando apenas aqueles que viram o Senhor ressurreto e foram investidos diretamente por ele na função apostólica (At 1.21-22; 1Co 9.1; Gl 1.1), recebendo também, da parte de Deus, revelações doutrinárias especiais que servem como fundamento doutrinário para a igreja de todas as épocas (Ef 2.20; 3.4-5). Nesse sentido estrito, os apóstolos só existiram no século I e foram apenas doze (Ap 21.14). No Capítulo 8 (A Doutrina Acerca da Igreja) há um quadro que mostra como o apóstolo no sentido técnico poderia ser identificado.

Profeta: Veja-se nos itens acima as considerações relativas ao dom de profecia.

Evangelista: É alguém que proclama as boas-novas. Nos tempos do NT designava especialmente missionários itinerantes que iam de cidade em cidade anunciando a mensagem de Cristo (At 8.5,26,40; 3Jo 1.7), embora o termo também seja aplicado a indivíduos que tinham um ministério fixo num determinado lugar (2Tm 4.5).

Pastor mestre: Essa expressão pode designar duas funções distintas (pastores e mestres) ou somente a função do ministro que se ocupa de pastorear e ensinar a igreja. O artigo definido que consta do texto grego aponta para a segunda opção, realçando a dupla responsabilidade que recai sobre os pastores, a saber: o cuidado e a instrução do povo de Deus (At 20.28; 1Pe 5.2-3).

LISTAS DE DONS NO NOVO TESTAMENTO

Romanos 12.6-8 – Profecia, serviço, ensino, exortação, contribuição, liderança e misericórdia.

1 Coríntios 12.8-10 – Palavra de sabedoria, palavra do conhecimento, fé, curas, operações de milagres, profecia, discernimento de espíritos, variedade de línguas e interpretação.

1 Coríntios 12.28 – Apóstolos, profetas, mestres, operadores de milagres, dons de curar, socorros, governos, variedades de línguas.

Efésios 4.11 – Apóstolos, profetas, evangelistas e pastores mestres.

1 Pedro 4.10-11 – Falar (de acordo com a palavra de Deus) e servir.

FIGURAS ASSOCIADAS AO ESPÍRITO SANTO

Figura – Pomba.
Referência – Mt 3.16; Jo 1.32-34.
Significado – Procedência celeste.

Figura – Água.
Referência – Jo 3.5; 7.37-39; 1Co 12.13; Tt 3.5.
Significado – Lavagem, satisfação espiritual e batismo.

Figura – Vento.
Referência – Jo 3.8.
Significado – Espiritualidade, impossibilidade de ser controlado em seus caminhos e ações.

Figura – Fogo.
Referência – At 2.3.
Significado – Presença de Deus, juízo, purificação.

Figura – Óleo.
Referência – Lc 4.18; At 10.38.
Significado – Unção, capacitação para realizar uma tarefa ou assumir uma função.

Figura – Selo.
Referência – Ef 1.13-14; 4.30.
Significado – Segurança, sinal de propriedade.

CUIDADO! VENENO!

Doutrina da segunda bênção:
Ainda que dentro do pentecostalismo existam crentes verdadeiros, esse movimento erra gravemente ao ensinar que o batismo do Espírito Santo só ocorre algum tempo depois da conversão desde que o crente o busque intensamente, devendo ainda ser acompanhado pelo dom de línguas. A crença de que essa chamada “segunda bênção” só é obtida depois de muito esforço próprio, por meio de jejuns, vigílias e orações, tem colocado um peso insuportável sobre os ombros de diversas ovelhas sinceras de Jesus, além de estimular a hipocrisia por parte de quem finge ter obtido esse “batismo”. Ora, em Gálatas 3.2, Paulo censura seus leitores dizendo que o Espírito Santo não pode ser recebido por meio da prática de obras de devoção.

Continuísmo: Os continuístas defendem a continuidade do apostolado e/ou dos chamados dons espetaculares, tais como profecias, línguas, curas e milagres (os que defendem a visão oposta são chamados cessacionistas). São na maioria pentecostais, mas é possível encontrar continuístas em todas as denominações evangélicas. Seus argumentos se ancoram, obviamente, nas passagens bíblicas que tratam desses dons e, em especial, no relato de experiências que afirmam ter tido ou testemunhado. É, contudo, precisamente no campo da experiência que a fragilidade do continuísmo se mostra mais evidente. Isso porque uma busca honesta demonstrará que não é possível encontrar hoje nenhuma igreja onde os dons espetaculares estejam em vigor nos termos descritos no Novo Testamento. Ao defender a continuidade desses dons, os continuístas ficam com o ônus da prova, tendo o dever não somente de apontar textos bíblicos que provem suas concepções, mas também igrejas locais em que os referidos dons estejam em completo, constante, nítido e real funcionamento. É, pois, sua tarefa fornecer, além de referências bíblicas, endereços postais que provem que os dons espetaculares estão e vigor. Com efeito, se esses dons perduram ainda hoje, onde é possível encontrá-los? Essa “prova postal”, porém, que seria muito fácil de produzir caso os tais dons ainda existissem, nunca pôde ser apresentada pelos continuístas. Tudo o que se encontra depois de uma acirrada busca são simulacros dos dons espetaculares, práticas bem diferentes daquelas vividas pela igreja dos tempos apostólicos.

Testemunhas de Jeová: Dizem que o Espírito Santo é uma força impessoal, rejeitando sua personalidade e divindade. Na verdade, essa seita designa o Espírito como a “força ativa de Deus” e chega a usar essa expressão para traduzir Gênesis 1.2. As Testemunhas de Jeová, ao negarem a divindade do Espírito, se assemelham aos pneumatomaquianos (oponentes do Espírito) ou macedonianos (nome originado no Bispo Macedônio de Constantinopla) do século IV que diziam que o Espírito Santo não tinha substância divina, sendo apenas uma criatura do Filho.

Continua em: 
CAPÍTULO 5 – A DOUTRINA ACERCA DO HOMEM (Antropologia)

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PEQUENO MANUAL DE DOUTRINAS BÁSICAS | Marcos Granconato

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