Profetas, fanáticos ou hereges? | John MacArthur



Talvez o aspecto mais preocupante do afã do movimento carismático por novas revelações seja a maneira negligente e indiscriminada pela qual tantas profecias questionáveis são recebidas como verdade divina.

OS PROFETAS DE KANSAS CITY

Um grupo de supostos profetas, em Kansas City demonstra quão longe tem ido o abuso da “profecia” no movimento carismático. Um livro que promove as atividades do grupo tornou-se, de imediato, um best-seller internacional.(1) Centenas, talvez milhares, de igrejas ao redor do mundo estão usando os padrões de “ministério profético” que estão de acordo com os “Profetas de Kansas City”.

Todos esses homens, associados a uma única seita — antes designada Kansas City Fellowship, mas agora chamada Metro Vineyard Fellowship — dizem que não gostam de ser rotulados como “profetas”. Preferem se autodesignar pessoas que têm o “dom profético”. Em outras palavras, eles não crêem possuir um ofício detentor de autoridade semelhante ao dos profetas do Antigo Testamento. Tampouco afirmam ser infalíveis. Ao contrário, todos os Profetas de Kansas City admitem ter profetizado falsamente.(2)

No entanto, as profecias proferidas por esses homens são recebidas por milhares de pessoas como a verdade revelada por Deus. O pastor da Metro Vineyard, Mike Bickle, encoraja ativamente o rebanho a aceitar as profecias modernas como um meio divino de revelar a verdade para a igreja.

Um dos videntes mais expressivos da igreja, Bob Jones, afirma que Deus lhe fala anualmente no Dia da Expiação (judaico). De acordo com a terminologia de Jones, o Senhor o coloca “sob o Cajado do Pastor” e lhe dá uma mensagem referente a toda a igreja em relação ao ano seguinte.(3) Nos últimos anos, Bickle e Jones têm proferido e explicado as profecias perante a congregação, encorajando as pessoas a agir de acordo com as profecias, como se fossem a Palavra de Deus.

A profecia do Cajado do Pastor, proferida por Jones, em 1989, incluía uma nova explicação do motivo por que tantas profecias modernas não se cumprem. Jones afirmou:

“[Deus] disse: “Se eu liberasse agora 100% da rhema, a responsabilidade seria tremenda, e vocês teriam tantos Ananias e Safiras em seu meio, que seriam incapazes de crescer — as pessoas ficariam bastante amedrontadas”. No entanto, ele disse: “Se a profecia fosse correta, ela mataria, em vez de amedrontar as pessoas e conduzi-las ao arrependimento”... Isso foi o que ele me disse; portanto, acredito que, se eu acertar dois terços dela, estarei em uma posição muito boa”.(4)

Bickle acrescentou: “Com relação aos dois terços: a primeira vez que Bob me disse isso, eu repliquei: dois terços?. Ele respondeu: ‘Sim, é o maior nível que esta nação já vislumbrou até hoje. Este é o mais alto de todos os níveis’”.(5)

Em outras palavras, os supostos profetas alegam possuir uma palavra da parte do Senhor, mas as chances de que ela será falsa é de uma em três — na avaliação mais otimista! Não nos admiramos com o fato de que suas profecias lançam tantos crentes em confusão extrema.

A despeito de seus pobres resultados, os “Profetas da Cidade de Kansas City” continuam a colecionar elogios do mundo todo. Freqüentemente eles são preletores no ministério de conferências internacionais de John Wimber (ver. Capítulo 6).(6)

No prefácio de Some Said It Thundered, O Dr. John White escreveu:

“De tempos em tempos surgem na igreja disputas por causa de “profetas”. No início do século XIX, surgiu a controvérsia irvingita, em Londres; e o profeta principal teve de confessar, anos mais tarde, que fora enganado. Vários de nós descobrimos que ouvir algo da parte de Deus não é tão fácil. Na verdade, a igreja sofreu tantas experiências ruins com os profetas, que agora reagimos de forma muito rápida e temerosa. Corremos o risco de perder algo bom por causa de experiências ruins, como jogar fora um bebê vivo por causa do horror com a água suja do banho”.(7)

Entretanto, será que existe algo bom nas revelações proféticas modernas? Esta é uma pergunta que muitos carismáticos não têm disposição de responder.

Por exemplo, o próprio White defende com ferocidade os Profetas de Kansas City. Apesar de reconhecer que eles “cometeram erros”.(8) White parece acreditar que a crítica contra os profetas é inerentemente satânica: “Satanás teme as palavras recém-saídas dos lábios de Deus... Visto que Satanás receia tanto a Palavra recente, ele suscitará controvérsias sempre que ela proceder de modo miraculoso dos lábios de um “profeta” verdadeiro ou dos lábios de um evangelista inflamado pelo Espírito”.(9)


Curiosamente, White crê que a controvérsia em torno dos Profetas de Kansas City constitui uma forte evidência de sua genuinidade. Na seção denominada erroneamente “Cuidado com os falsos profetas”, ele cita as advertências de Jesus a respeito dos falsos profetas encontradas em Mateus 7.15, 24.11 e Marcos 13.22. Em seguida, White afirma: “Somos advertidos de que isso ocorrerá. A maioria dos estudiosos acredita que as palavras de Jesus são aplicáveis aos últimos dias. Elas podem estar se referindo a nós agora. Como podemos discernir o verdadeiro do falso? Por meio de uma característica: os verdadeiros profetas não serão populares”.(10)

Permita-me dizê-lo do modo mais claro possível: Este é o PIOR ponto de partida para o debate a respeito de como discernir os falsos profetas. Com certeza, quem fala a verdade é impopular; entretanto, a popularidade não é um teste de autenticidade, nem mesmo de fidelidade. Jesus e João batista passaram por certas etapas de seu ministério em que foram bastante populares.

O único teste do verdadeiro profeta é a fidelidade de suas profecias: “Se disseres no teu coração: Como conhecerei a palavra que o Senhor não falou? Sabei que, quando esse profeta falar em nome do Senhor, e a essa palavra dele não se cumprir, nem suceder como profetizou, esta é a palavra que o Senhor NÃO disse; com soberba a falou o tal profeta; não tenhas temor dele” (Dt 18.21,22).

Na época da lei, qual era a punição para esse tipo de profecia? “O profeta que presumir em falar alguma palavra em meu nome que Eu não lhe mandei falar... esse profeta será morto” (Dt 18.20 — ênfase acrescentada).

Admiravelmente, na avaliação de cinco páginas a respeito de como discernir falsos profetas, White NÃO menciona nem mesmo uma vez aexatidão ou a fidelidade como teste! De fato, ele declara explicitamente acrença de que esses não são testes válidos das credenciais do profeta. Crê que profecias falsas não desqualificam, necessariamente, a pessoa para falar em nome de Deus. E conclui a sessão sobre o discernimento dos falsos profetas com essas palavras: “É claro que os profetas são seres humanos. Portanto, eles podem cometer erros e mentir. E não precisam deixar de ser profetas por causa de seus equívocos e erros”.(11)

Essa declaração deixa transparecer a ignorância a respeito do que a Escritura afirma sobre profecias inspiradas. O dom profético no Novo Testamento (Rm 12.6; 1Co 12.10) está relacionado com a declaração, e não com a revelação. O profeta do Novo Testamento “fala aos homens, edificando, exortando e consolando” (1Co 14.3). Ele é um pregador, não uma fonte de revelação contínua. Está incumbido de anunciar, e não de predizer; ou seja, ele proclama a verdade já revelada. De modo geral, ele não é um condutor de novas revelações.

Na igreja primitiva, antes da finalização do Novo Testamento, alguns profetas foram enviados por Deus em determinadas ocasiões para exortar a Igreja com mensagens inspiradas à medida que o profeta falava. Isso era necessário para instruir a Igreja sobre questões ainda não tratadas pela Bíblia. Esse aspecto revelador da profecia foi exclusivo à era apostólica.

A perspectiva carismática contemporânea, que transforma todo profeta em instrumento de revelação divina, deprecia a Escritura e a profecia. Ao permitir que os profetas misturem erros com mensagens supostamente “procedentes dos lábios de Deus”, os carismáticos têm aberto as portas a falsos ensinamentos, confusões, erros, fanatismo e caos. Como poderia a mensagem genuinamente inspirada por Deus ser corrompida por erros ou mentiras? A profecia inspirada deveria estar no mesmo nível da Escritura. É a própria Palavra de Deus. Toda revelação profética continha um “assim diz o Senhor” — explícita ou, ao menos, implicitamente. A profecia reveladora não era a opinião ou a especulação do profeta. Tampouco era uma simples impressão de sua mente. Não era um palpite ou adivinhação. Não era clarividência. Era uma palavra da parte do Senhor (cf. 1 Sm 3.1; Jr 37.17). E, visto que o profeta falava em nome de Deus, ele era reputado com o mais elevado padrão de confiança — e julgado com a maior severidade, caso profetizasse falsamente (Dt 13.1-5; 18.20-22).(12)

É lógico que o profeta, ao transmitir uma revelação, tornava-se porta-voz das próprias palavras de Deus. Toda revelação profética autêntica era verdadeira, confiável e inerrante, como a própria Escritura. De outro modo, tornaríamos Deus mentiroso ou deveríamos minimizar o significado da revelação e aceitar o nível secundário de inspiração. Teríamos de criar uma teoria de acordo com a qual, de algum modo, Deus capacitaria os profetas contemporâneos a entregar mensagens que seriam verdadeiras para ele mesmo, mas não teriam autoridade como Escritura. Isto é exatamente o que alguns “apologistas” da profecia carismática moderna tentam fazer.

Bill Hamon, por exemplo, lidera uma rede de “ministérios proféticos”. Ele escreveu:

“É claro que o ministério profético não foi dado à igreja a fim de suplantar a Bíblia. Qualquer “acréscimo” recente à Escritura, outorgada como mensagem profética e aceita como infalivelmente inspirada, deve ser falsa. Em vez disso, o ministério profético traz iluminação e explicação sobre o que já foi escrito, tornando-o pessoal aos crentes”.(13)

Entenda que, ao falarem sobre a profecia, Hamon e outros carismáticos se referem a uma nova revelação divina. Hamon crê que “todas as profecias pessoais são condicionais, quer suas condições sejam apresentadas com clareza ou não”.(14) Isto é, as profecias “podem ser canceladas, alteradas, revertidas ou reduzidas; porque esse tipo de profecia, para se realizar, exige a participação e a cooperação adequada de quem recebe a palavra profética”.(15) Portanto, no esquema de Hamon, o fato de que uma profecia deixa de se cumprir não é uma prova de sua falsidade. Caso as circunstâncias mudem ou falte fé ao próprio profeta, “Deus” pode mudar a profecia — ou mesmo cancelá-la.(16)

Indubitavelmente, Hamon nega equiparar a revelação profética moderna à Escritura. Contudo, na prática, torna-se impossível manter qualquer distinção. Mais adiante, no mesmo artigo, Hamon escreveu:

“Escreva e leia suas profecias pessoais e medite nelas. O apóstolo Paulo disse a Timóteo: “Não te faças negligente para com o dom que há em ti, o qual te foi concedido mediante profecia, com a imposição das mãos do presbitério. Medita estas coisas e nelas sê diligente, para que o teu progresso a todos seja manifesto” (1Tm 4.14,15)”.(17)

Retirando versículos do contexto, Hamon encoraja as pessoas a prestarem às profecias pessoais o tipo de estudo e reflexão reverentes que devemos dar à Bíblia (cf. Js 1.8; Sl 1.2). É exatamente neste ponto que incorrem em dificuldades os carismáticos que desejam afirmar a supremacia das Escrituras, mas, ao mesmo tempo, aceitam revelações particulares. Devo escrever minhas profecias e meditar nelas? Se eu as ignorar, isso será pecado? Se for pecado, terei canonizado a revelação. Se não for pecado, eu a terei considerado supérflua. Hamon optou por canonizá-la.

Ele comete esse erro por aconselhar às pessoas que ignorem a razão, a lógica e os sentidos, quando tentam “dar testemunho com a exatidão de uma palavra profética, em espírito e conteúdo”.(18) Ele escreveu:

“Às vezes ouço pessoas dizerem: “Não dou testemunho com essa profecia”. Entretanto, após questioná-las, descobri que a profecia não se encaixava com a teologia, os desejos ou os objetivos dessas pessoas e que suas emoções reagiam negativamente à profecia. Elas falharam em entender que não damos testemunho com a alma — a mente, as emoções ou a vontade.

Nossa faculdade de raciocínio encontra-se na mente, e não no espírito. Portanto, nossas tradições, crenças e opiniões não são testemunhas verdadeiras da verdade profética. A reação espiritual tem origem profunda em nosso ser. Muitos cristãos descrevem a localização física de sua sensação correspondente na região superior do abdome.

O testemunho negativo — com a mensagem “não”, “tenha cuidado” ou “algo não está certo” — é manifestado comumente com o sentimento de tensão, inquietação ou desconforto. Existe uma sensação profunda, mas quase ininteligível, de que algo está errado. Só podemos confiar nessa sensação quando estivermos em maior sintonia com nosso espírito do que com nossos pensamentos. Se você pensa, causa essas sensações¸ então, isto é apenas uma reação da alma.

Por outro lado, quando o Espírito de Deus testemunha ao nosso espírito que uma palavra profética está correta, procede de Deus e está de acordo com sua vontade e propósito, nosso espírito reage com o fruto do Espírito Santo. Sentimos paz e alegria profundas e inexplicáveis e uma sensação arrebatadora de amor — podemos até sentir que nosso espírito pula de contentamento. Essa sensação nos permite saber que o Espírito Santo dá testemunho ao nosso espírito de que tudo está em ordem, embora não possamos entender todas as coisas ditas, pois, do contrário, nossa alma não será capaz de se ajustar imediatamente a todos os pensamentos apresentados”.(19)

Em outras palavras, ignore sua mente, esqueça suas crenças, desconsidere sua teologia e o bom senso; a sensação na parte superior de seu abdome lhe dirá quão importante uma “profecia” realmente é.

ISSO É UM ABSURDO TOTAL. Não achamos esse tipo de conselho na Bíblia. A sensação que a parte superior de seu abdome transmite não diz nada sobre a veracidade ou não de uma profecia. Você pode estar sofrendo de indigestão! Quantas pessoas, ao seguirem esse tipo de conselho, ouvem um autodenominado oráculo falar e manipular membros de igrejas para doarem suas economias ao ministério do “profeta”?

Esse modo de pensar permeia o movimento carismático. Por fim, muitas profecias não passam de sensações. Essa é a razão por que o erro e a confusão são tão desenfreados nas congregações lideradas por aqueles que chamam a si mesmos de profetas.

Recebi uma fita de áudio de um desses “pastores-profetas”, James Ryle, pastor da Boulder Valley Vineyard, no Colorado. Ryle descreveu com detalhes alguns de seus sonhos que ele considerou revelações proféticas da parte de Deus. Segundo os sonhos de Ryle, Deus está pronto para ungir músicos cristãos com a mesma unção concedida aos Beatles. Ele cita uma palavra do Senhor: 
“Chamei esses quatro moços de Liverpool para mim mesmo. Havia um chamado divino na vida deles; eles foram dotados por minha mão; eu os ungi, porque tinha um propósito — desencadear um avivamento carismático com o avivamento musical em todo o mundo”.

O que aconteceu? De acordo com Ryle, Deus lhe disse: “Os quatro moços de Liverpool desertaram e não serviram em meu exército. Serviram a seus próprios propósitos e usaram o dom para favorecer o outro lado”. Ryle afirmou que Deus lhe disse que 
suspendeu a unção em 1970 e a reteve desde então. No entanto, Ele está a ponto de liberá-la novamente à igreja.(20) Ryle é jovem, bem-preparado, articulado e tem pregado a respeito de sua profecia em várias igrejas. Fitas de áudio dessas mensagens circulam em vários países, e milhares de pessoas recebem sua profecia como verdade absoluta da parte de Deus.

No entanto, permanece o fato de que, desde o término do cânon bíblico,nenhum avivamento genuíno ou movimento ortodoxo foi liderado, emmomento algum, por pessoas cuja autoridade se baseava em revelações particulares da parte de Deus. Diversos grupos têm afirmado receber novas revelações, mas todos eles têm sido fanáticos, hereges, sectários ou fraudulentas. Carismáticos e não-carismáticos precisam considerar se há um paralelo entre esses grupos e o movimento carismático moderno.

–– John MacArthur | O Caos Carismático
–– Fonte 1: 
https://jppadilhabiblia.blogspot.com/
–– Fonte 2: Página 
JP Padilha

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