3 - Cinco princípios para a interpretação correta da Bíblia



Eis cinco princípios básicos que podem ser de grande auxílio quando falamos em hermenêutica bíblica:


1. O princípio literal.

Quando falamos em interpretar a Escritura literalmente, não nos referimos ao literalismo escravizante e rígido. Interpretar literalmente significa entender a Escritura em sua lógica normal, incluindo figuras de linguagem como parábolas, hipérboles, símiles, metáforas e simbolismo.


A Bíblia deve ser lida de maneira natural. No passado, os teólogos falavam sobre o ‘usus loquendi’ — significando que as palavras da escritura devem ser interpretadas da mesma maneira como são entendidas em seu uso diário. Deus comunicou-nos sua Palavra por meio da linguagem humana, e existem razões para presumirmos que Ele o fez do modo mais evidente e simples. Suas palavras devem ser compreendidas da mesma maneira como interpretamos a linguagem do discurso normal. Apesar de existirem figuras de linguagem e simbolismo nas Escrituras, essas coisas são bem evidentes nos lugares em que são empregadas. A primeira coisa a ser procurada pelo intérprete cuidadoso é o significado literal, e não algum tipo de interpretação mística, profunda, oculta, secreta ou espiritualizada.

Algumas passagens apocalípticas, como as de Zacarias, Daniel, Ezequiel, Isaías e Apocalipse, contêm figuras e símbolos que precisam ser estudados com atenção para descobrirmos a verdade literal que transmitem. No entanto, esse tipo de linguagem simbólica não é o padrão bíblico, e percebemos com clareza onde ela é empregada. Às vezes o simbolismo é difícil de ser interpretado, mas, pelo estudo do ambiente histórico, podemos discernir seu significado. Até a linguagem figurada comunica verdades claras e literais. A Escritura não é um quebra-cabeça com o qual algumas pessoas desejam brincar.

As parábolas são outra forma de linguagem figurada usada ocasionalmente na Bíblia. São estórias que ilustram uma verdade espiritual; todavia, seus pormenores podem não ser reais. Pessoas, acontecimentos, tempos e lugares talvez sejam hipotéticos, metafóricos ou simplesmente não identificáveis. No entanto, as verdades espirituais ilustradas pelas parábolas sempre são literais e reais.

Aqueles que abandonaram a interpretação literal em favor da interpretação mística ou alegórica, abriram mão da esperança de manter a exatidão e coerência. Em seu lugar, têm apenas a possibilidade de chegar aonde a imaginação conduzir. Quando negam o significado literal, não honram a Bíblia, por tentarem compreendê-la; antes, tornam-na sua escrava por moldá-la para dizer o que desejam que ela diga.

Alguns rabinos do período intertestamentário interpretavam a Escritura por meio da numerologia. Isto é, usavam o equivalente numérico de cada letra do alfabeto hebraico para extrair significados místicos das palavras. Sua linha de interpretação os levou a algumas interpretações bizarras. Por exemplo, em hebraico, o valor numérico da soma das letras do nome de Abraão é 318. Isso os levou a concluir que Abraão possuía 318 servos! É fácil perceber que, pela violação do propósito simples da linguagem, qualquer interpretação é possível.

2. O princípio histórico.

Como já observamos, um dos passos cruciais para entendermos o significado de um texto é o conhecimento do ambiente cultural, geográfico e político no qual se insere a passagem. Quando entendemos o contexto histórico, a passagem freqüentemente interpreta-se a si mesma.


Para entendermos qualquer livro da Bíblia, temos de compreender a história envolvida. No caso de uma epístola enviada às igrejas, quais eram algumas características da cidade em que viviam os crentes? Quais as condições político-sociais? Quem governava o quê? Quais as pressões sociais envolvidas e qual a intensidade? Quais eram as tensões, problemas e crises da comunidade? Como era a cultura da época? Quais os costumes das pessoas?

Por exemplo: é quase impossível o leitor moderno dar sentido à admoestação de 1 Pedro 1.13: “Cingindo os lombos do vosso entendimento...” (ARC). No entanto, quando sabemos que os soldados, nos dias do Novo Testamento, vestiam-se com longas túnicas esvoaçantes e precisavam prendê-las em torno da cintura para não tropeçarem nelas quando se dirigiam à batalha, o significado do texto de Pedro torna-se imediatamente claro. Ele estava dizendo: “Preparem a mente para a batalha. Livrem-se de todo empecilho e daquilo que os atrasa”.


Para responder perguntas culturais e históricas, podemos usar dicionários, manuais e comentários bíblicos, livros de história e costumes bíblicos. Eles possibilitam a reconstrução do ambiente bíblico de uma passagem, e do contexto histórico surgirá o significado evidente.

3. O princípio gramatical.

Com certa freqüência, a construção sintática de uma passagem é a chave para o seu entendimento. Por exemplo: às vezes o significado de uma frase pode depender de algo tão simples como uma preposição. É importante saber se na expressão encontra-se “por causa de”, “por meio de”, “em”, “por” ou “com”. Em alguns casos, o vocábulo grego original pode ser traduzido por duas ou mais palavras portuguesas diferentes. É importante saber se a palavra que aparece em sua Bíblia portuguesa possui traduções alternativas. Além disso, caso a frase se refira a “isto” ou a “ele”, é importante conhecer o antecedente do pronome.


A gramática pode não ser seu assunto predileto — com certeza não é o meu —, mas precisamos possuir conhecimentos básicos para interpretarmos a linguagem bíblica. Devemos seguir a ordem das palavras e das frases para sabermos com exatidão o que a Palavra de Deus diz. O entendimento exato da passagem pode depender disso.

Às vezes, pessoas me perguntam: “O que você faz em primeiro lugar para preparar uma mensagem?” Eu lhes digo que estudo o texto bíblico na língua original — grego ou hebraico. Faço anotações sobre a ordem das palavras e das frases. Verifico a estrutura e a gramática da sentença. Desejo saber exatamente o que ela diz.

Isso pode ser feito por qualquer pessoa que deseja investir um pouco de tempo e esforço. Mesmo não sabendo grego e hebraico, podemos usar uma tradução interlinear, que contém abaixo da língua original o texto correspondente em português. Pelo menos um bom comentário bíblico pode ser consultado. Preste atenção aos autores e pregadores que dão atenção à gramática; cuidado com os que não o fazem. Aprenda a fazer estudos bíblicos indutivos, separando os versículos em frases, destacando substantivos, verbos, modificadores e outras partes do discurso a fim de observar o seu significado com mais clareza.(3)

4. O princípio da síntese.

Os reformadores usavam a expressão latina ‘scriptura scripturam interpretatur’ (“a Escritura interpreta a Escritura”). Com isso, eles afirmavam que as passagens obscuras devem ser entendidas à luz das passagens mais evidentes. Se a Bíblia é a Palavra de Deus, ela precisa ser coerente consigo mesma. Nenhuma parte da Bíblia pode contradizer qualquer outra parte. Um autor divino, o Espírito Santo, inspirou toda a Bíblia; portanto, ela possui uma unidade maravilhosa e sobrenatural. O princípio da síntese une uma parte da Escritura à outra para chegar ao significado claro e coerente. Caso sustentemos a interpretação de uma passagem que não se harmoniza com outra, uma delas foi interpretada incorretamente ou, talvez, ambas. O Espírito Santo não discorda de Si mesmo. E as passagens de significado óbvio devem interpretar as mais complexas. Nunca devemos elaborar uma doutrina com base em um texto obscuro ou de interpretação incerta.(4)

Quando ensino uma passagem bíblica, geralmente guio a congregação a diversas partes da Escritura para demonstrar como a passagem estudada se encaixa no contexto total da Bíblia. Em seu excelente livro God has Spoken (Deus Falou), James I. Packer escreveu:


“A Bíblia assemelha-se a uma orquestra sinfônica, e o Espírito Santo é o maestro. Cada músico foi levado voluntária, espontânea e criativamente a tocar as notas como o grande maestro desejava, apesar de nenhum deles ser capaz de ouvir a música de forma integral... O valor de cada parte torna-se completamente evidente quando visto em relação a todo o restante”.(5)

Pedro disse esta mesma coisa ao escrever: “Foi a respeito desta salvação que os profetas indagaram e inquiriram, os quais profetizaram acerca da graça a vós outros destinada, investigando, atentamente, qual a ocasião ou quais as circunstâncias oportunas, indicadas pelo Espírito de Cristo, que neles estava” (1Pe 1.10-11). Até os escritores da Bíblia não entendiam plenamente o significado do que escreviam. Hoje, pelo fato de que o Novo Testamento está completo, sabemos como a Bíblia se inter-relaciona em um todo glorioso e compreensivo.

5. O princípio da aplicação prática.

A pergunta final que devemos formular é: e agora? O que tudo isso tem a dizer-me? 2 Timóteo 3.16a afirma: “Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil”. Todas as suas partes aplicam-se à nossa vida de uma maneira ou de outra. Ela é útil para “o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça”.


O ‘ensino’ é a verdade divina fundamental, o princípio ensinado por toda passagem. Compreende os princípios pelos quais vivemos. Por exemplo: a Bíblia contém certos ensinos a respeito do casamento e da família. Devemos aplicar esses princípios à nossa vida. A ‘repreensão’ é o modo como a Escritura desmascara nosso pecado, revela a culpa escondida e traz à luz o segredo embaraçador. Quando aplicamos corretamente o ensino, a primeira conseqüência é deixar que as Escrituras nos reprovem. A reprovação conduz à ‘correção’, que envolve o abandono dos pecados pelos quais fomos reprovados. Em seguida, ocorre a ‘educação na justiça’ — o estabelecimento de um comportamento novo e justo em resposta à verdadeira doutrina. Essa é a obra prática da Palavra de Deus.

–– John MacArthur | O Caos Carismático
–– Fonte 1: Página JP Padilha
–– Fonte 2: https://jppadilhabiblia.blogspot.com/

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