2 - Três erros que devem ser evitados


2 Timóteo 2.25 afirma a respeito do estudo bíblico: “Procura apresentar-te a Deus aprovado, como obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade”. Torna-se evidente que o manejar a Escritura requer diligência e cuidado. Ela deve ser tratada assim. Quem não procede desse modo será envergonhado.

Permita-me sugerir três erros evitáveis:

1. Evite ganhar uma discussão ao custo da interpretação correta.

Para um pastor ou mestre é fácil — e, às vezes, tentador — dar outro significado a uma passagem bíblica para obter dela a resposta desejada.

Um bom exemplo desse erro é encontrado no Talmude (série de comentários sobre as Escrituras hebraicas). Um rabino tenta convencer pessoas de que o assunto mais importante da vida é a preocupação com os seres humanos. Para isso, ele usa as pedras da torre de Babel (em Gênesis 11) para apoiar sua afirmação, alegando que os edificadores da torre foram impedidos de continuar sua obra, porque colocavam as coisas materiais em primeiro lugar e as pessoas em último. À medida que a torre aumentava, o transportador gastava algumas horas para levar uma carga de tijolos aos pedreiros que trabalhavam no topo da torre. Se algum homem caísse da torre enquanto descia, ninguém daria atenção. Era só um trabalhador a menos. Se ele caísse enquanto subia, lamentava-se a queda devido à perda da quantidade de tijolos transportados. Essa, disse o rabino, foi a razão por que Deus lhes confundiu a língua deles — eles falharam em dar prioridade aos seres humanos.


Isso não se encontra na Bíblia e, na verdade, distorce a lição desse capítulo de Gênesis. É verdade: as pessoas são mais importantes do que tijolos, mas esse não é o ensino central do episódio da torre de Babel. Gênesis 11 não diz nada a respeito da importância das pessoas e da insignificância dos tijolos. Este é o ensino central da passagem: Deus é mais importante do que ídolos e traz juízo sobre a idolatria. Babel foi o juízo de Deus sobre homens orgulhosos que O desafiavam. Jamais devemos inventar uma boa mensagem em detrimento da verdadeira lição de uma passagem bíblica.

2. Evite o estudo superficial.

O estudo bíblico acurado é uma tarefa árdua. Como vimos, discernir o que Deus nos comunica por meio da Palavra não pode ser feito por deslizarmos o dedo sobre passagens bíblicas, à procura de mensagens onde os olhos pararem. Tampouco o entendimento da Bíblia é uma questão de opinião pessoal (“Para mim isso significa...” etc).


O manuseio cuidadoso e acurado da Palavra de Deus requer diligência. Se formos diligentes, poderemos chegar à interpretação correta das principais verdades da Escritura e ao fluxo do argumento de passagens específicas. Deus não ocultou de nós a sua verdade. Mas o significado não é sempre óbvio. Às vezes, o verdadeiro significado de uma passagem é revelado pela compreensão da cultura à qual se refere. Outras vezes, ele é esclarecido por uma simples nuança da língua original. Essa é a razão por que não podemos ser bem-sucedidos por meio do improviso casual ou do deslizamento de dedos pelas páginas da Bíblia — práticas tão populares em algumas “igrejas” hoje. Algumas diferenças de interpretação jamais serão resolvidas nesta vida, mas isso não nos exime da responsabilidade de estudar as Escrituras com cuidado e diligência.

Timóteo 5.17 nos diz que “devem ser merecedores de dobrados honorários” os que, na igreja, “se afadigam na palavra e no ensino”. Ester foi o motivo por que Deus concedeu mestres à igreja — o entendimento de sua Palavra e a instrução correta do povo nas Escrituras exigem pessoas comprometidas com o trabalho dedicado, persistente e consciente, em resposta ao chamado divino.

Bernard Ramm escreveu:

“Pessoas devotas costumam afirmar a possibilidade de conhecer a Bíblia sem qualquer ajuda. Elas costumam prefaciar suas interpretações com uma afirmação semelhante a esta: “Queridos amigos, não li nenhum livro humano, nem consultei nenhum comentário feito por homens. Dirigi-me apenas à Bíblia para verificar o que ela diz por si mesma”. Isto parece muito espiritual e normalmente é acompanhado de ‘améns’ dos ouvintes.

Todavia, este é o caminho da sabedoria? Algum homem tem o direito ou a erudição para ignorar todo o ensino da igreja? Cremos que não.

Em primeiro lugar, embora a reivindicação de ignorar todos os livros humanos e de consultar á própria Bíblia pareça algo piedoso e espiritual, na verdade isto é egoísmo velado. É uma afirmação sutil de que o homem pode conhecer adequadamente a Bíblia sem a erudição incansável, piedosa e consagrada de homens como Calvino, Bengel, Alford, Lange Ellicott ou Moule...

Em segundo lugar, essa reivindicação expressa a velha confusão entre a inspiração e a iluminação do Espírito. A função do Espírito não é comunicar novas verdades ou ensinar assuntos desconhecidos, e sim iluminar a revelação contida nas Escrituras. Suponha que selecionemos uma lista de palavras do livro de Isaías; e procuremos alguém que afirma poder ignorar o piedoso aprendizado cristão, e lhe peçamos que explique, por si mesmo, o significado de: Tiro, Sidom, Quitim, Sior, Moabe, Calno, Carquemis, Hamate, Aiate, Migrom, Micmás, Geba, Anatote, Laís, Nobe e Galim. O único esclarecimento que ele poderá obter sobre essas palavras será em comentários ou dicionários bíblicos”.(2)

Ramm estava descrevendo a falta de respeito à obra de teólogos e expositores dotados por Deus, que passaram anos estudando e interpretando as Escrituras — e essa falta de respeito tende a ser uma característica dos carismáticos. Por quê? Será que é por causa da ênfase que os carismáticos dão à possibilidade de qualquer pessoa, na congregação, afirmar o que ela pensa lhe foi dito pelo Espírito a respeito de um versículo bíblico? Existe uma grande diferença entre interpretações esquisitas e o ensino de estudiosos que possuem habilidades e ferramentas para explicar o significado da Palavra de Deus. Infelizmente, os carismáticos parecem atraídos às interpretações esquisitas.

Em um programa de rádio, ouvi uma entrevista em que se perguntou a uma “pastora” carismática como ela obtinha os sermões. Ela respondeu: “Eu não os obtenho; recebo-os. Deus os entrega a mim”. Suas palavras refletem uma atitude extremamente comum em seu movimento. Muitos realmente acreditam que estudar é falta de espiritualidade. E alguns afirmam (retirando um versículo completamente do contexto): “Afinal de contas, Jesus não disse: ‘Por que o Espírito Santo vos ensinará, naquela mesma hora, as coisas que deveis dizer’ (Lc 12.12)?”

Devemos nos preocupar muito com essa maneira negligente de lidar com a Bíblia. Muitas pessoas ocupam púlpitos com pouca ou nenhuma preparação, dizendo aos outros o que Deus afirma. De forma geral, elas não dizem o que Deus disse. Muitas dessas pessoas desenvolvem sua teologia à medida que falam.

3. Não espiritualize ou alegorize, a menos que o texto o exija.

Algumas pessoas usam a Escritura como fábula para ensinar o que querem ressaltar. Em vez de procurarem o significado do conteúdo bíblico, transformam-no em alegoria para apoiarem o que desejam ensinar.

Certo casal — que, por causa de seus problemas conjugais, procurou um de nossos pastores-assistentes para obter aconselhamento — é um exemplo extremo do uso de alegorias. O pastor começou a conversar com eles e perguntou-lhes, depois de cerca de trinta minutos:

–– “Por que vocês se casaram? Vocês estão a quilômetros de distância um do outro”.


— “Foi por causa do sermão pregado pelo pastor de nossa igreja”, respondeu o marido.

— “Qual foi o tema?”

— “Bem, ele pregou sobre Jericó”.

— “Jericó! Qual é a relação disso com o casamento?”

— “Bem, ele disse que o povo de Deus reivindicou a cidade, marchou sete vezes à volta dela, e as muralhas caíram. Ele falou que, se um jovem cresse que Deus lhe teria concedido alguma jovem, poderia reivindicá-la, marchar à volta dela sete vezes, e as muralhas de seu coração cairiam. Portanto, foi isso o que eu fiz, e nos casamos”.

— “Isso não pode ser verdade”, replicou o pastor-assistente. “Vocês estão brincando, não é?”

— “Não, é verdade”, disse o marido. “Existem muitos outros casais que se uniram por causa do mesmo sermão!”

Algumas pessoas crêem que seu casamento foi estabelecido no céu. Na história que acabamos de mencionar, um casamento foi transformado em alegoria — e do tipo mais medíocre. Esse tipo de interpretação surgiu nos primeiros dias da igreja e continua até hoje, especialmente no movimento carismático. Um famoso pregador carismático, com quem tenho conversado com freqüência, pregou uma série de sermões sobre o livro de Neemias. À medida que ele ensinava, todos os pontos do livro representavam algo diferente ou significavam alguma coisa simbólica. Eis algumas de seus ensinos:

As muralhas de Jerusalém estavam arruinadas, e isso dá a entender as muralhas destruídas da personalidade humana. Neemias representa o Espírito Santo, que vem para reedificar as muralhas da personalidade humana. Quando se refere ao açude do rei (Ne 2.14), esse pastor afirma que o açude simboliza o batismo do Espírito Santo e, a partir disso, continua ensinando sobre importância de ‘falar em línguas’.

O livro de Neemias não tem nenhuma ligação com as muralhas da personalidade humana, com o batismo do Espírito ou com o falar em línguas. Todavia, quando um pregador atribui esse significado à aplicação da história, algumas pessoas o consideram um ensino bíblico maravilhoso. Eu não concordo. Considero-o um tipo de mercenarismo, pois faz a Bíblia dizer o que eles querem, em vez de afirmar o que Deus nos diz (cf. 2Co 2.17).

Para desenvolvermos uma abordagem correta na interpretação das Escrituras, temos o modelo dado pelo próprio Senhor na estrada de Emaús, logo após a sua ressurreição. À medida que caminhava com dois dos discípulos, ensinava-lhes e, “começando por Moisés, discorrendo por todos os Profetas, expunha-lhes o que a seu respeito constava em todas as Escrituras” (Lc 24.27). Neste versículo, o vocábulo grego que significa “expor” é hermeuneuō, do qual procede a palavra portuguesa hermenêutica. Quando Jesus ensinava as Escrituras, ele as interpretava de modo correto, em ordem. Ele usava hermeuneuō — hermenêutica. Jesus é o modelo perfeito do mestre que usa métodos interpretativos corretos. Interpretar as Escrituras de qualquer outro modo adultera a Palavra de Deus.

–– John MacArthur | O Caos Carismático
–– Fonte 1: Página 
JP Padilha
–– Fonte 2: 
https://jppadilhabiblia.blogspot.com/

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