Capítulo Sete - Como uma decisão pode ser tomada sem unanimidade?


PERGUNTA: Como uma decisão pode ser considerada “decisão de assembleia” quando muitos na assembleia não concordam com ela?


RESPOSTA: Talvez eu devesse fazer alguns comentários sobre como é formulada uma “decisão de assembleia” antes de responder esta pergunta. Quando os problemas surgem e se faz necessário um julgamento ou ação administrativa para algo relacionado à assembleia, os irmãos responsáveis se reúnem à parte da assembleia para entenderem melhor os fatos e buscar nas Escrituras como a assembleia deve agir. Este princípio é encontrado em Atos 15. Embora o que vemos em Atos 15 não seja exatamente uma reunião de irmãos, como costumamos chamar, já que ali era uma reunião de irmãos de diversas localidades, a passagem estabelece o princípio de que os assuntos podem ser examinados por irmãos responsáveis à parte da assembleia como um todo. Ali diz: “Congregaram -se, pois, os apóstolos e os anciãos para considerar este assunto” (At 15:6). Repare que as irmãs, irmãos jovens e novos convertidos não são mencionados como participando da reunião. As coisas não devem ser todas discutidas em detalhe perante toda a assembleia, pois podem ocorrer alguns debates (At 15:7) que não ficariam bem em uma reunião pública. Além disso, há coisas que são tratadas que poderiam contaminar e não serem apropriadas em uma circunstância assim (1 Co 14:40).

O modo normal de o Senhor guiar biblicamente a assembleia em suas responsabilidades administrativas é por meio daqueles que “presidem” (1 Ts 5:12-13; Hb 13:7, 17, 24; 1 Co 16:15-18; 1 Tm 5:17). Presidir ou liderar nestas questões não se refere a liderar no ensino ou pregação pública, mas nas coisas administrativas da assembleia. Confundir estas duas coisas é não entender a diferença entre dom e ofício. Alguns daqueles que “presidem” podem nem sequer ensinar publicamente, mas é muito bom e proveitoso quando eles o fazem (1 Tm 5:17). Estes homens devem conhecer os princípios da Palavra de Deus e estarem capacitados a apresentá-los de modo que a assembleia possa entender o curso de ação que Deus gostaria que ela tomasse no caso em tela (Tt 1:9). Estes homens não se elegem a si mesmos para este papel, mas são levantados pelo Espírito Santo para tal obra (At 20:28). Eles serão reconhecidos pela assembleia como pessoas que têm se dedicado ao cuidado dos santos e também pelo conhecimento que têm de princípios,
sendo reconhecidos como aptos em sua experiência e capacidade de julgar.

Há três palavras gregas usadas nas epístolas para descrever estes líderes responsáveis na assembleia local.

A primeira, “anciãos” (Presbuteroi) refere-se àqueles de idade avançada e implica maturidade e experiência. Todavia, nem todos os homens mais velhos na assembleia atuam necessariamente como líderes (1 Tm 5:1; Tt 2:1-2).

A segunda é “bispos” (Episcopoi), que tem o sentido de supervisores e se refere ao trabalho que fazem, que é o de pastorear o rebanho (At 20:28; 1 Pe 5:2), zelando pelas almas (Hb 13:17) e admoestando (1 Ts 5:12).

A terceira é “guias” (Hegoumenos), que tem o sentido de líderes e se refere à sua capacidade espiritual de liderar os santos.

No livro de Apocalipse aqueles que têm este papel são chamados de “estrelas” e também de “o anjo da igreja em [localidade]” (Ap 1-3). Como “estrelas” eles devem agir como portadores de luz para a assembleia local, dando testemunho da verdade de Deus (os princípios de Sua Palavra), e provendo luz sobre os diversos assuntos com os quais a assembleia possa ser confrontada. Isto está ilustrado em Atos 15. Apesar de ali a ação não se referir exatamente ao ligar e desligar, podemos aprender princípios valiosos de sua função administrativa na igreja. Depois de escutarem do problema que estava afligindo a assembleia, Pedro e Tiago lançaram luz sobre o assunto. Tiago aplicou um princípio da Palavra de Deus e deu sua opinião quanto àquilo que ele cria que o Senhor gostaria que fizessem (At 15:15-21). Atuando como “o anjo da igreja”, aqueles que tinham este papel devem servir de mensageiros para levar o pensamento de Deus à assembleia na hora de uma decisão ser tomada. Isto é também ilustrado em Atos 15:23-29.

Quando estes irmãos sentem que têm discernimento de qual seja a vontade do Senhor baseada nas Escrituras, com respeito ao que a assembleia deve fazer em uma situação em particular, então eles apresentam os fatos e as conclusões bíblicas diante da assembleia (não necessariamente os detalhes, pois estes poderiam contaminar outros), de modo que a consciência de todos possa ser exercitada no assunto (At 15:22). Então aquela é uma decisão “ligada” ou ratificada (Mt 18:18-20). É chamada de “decisão de assembleia” porque ela foi tomada em assembleia, isto é, quando a assembleia se reuniu como tal, tendo o Senhor em seu meio, e por ser assim uma decisão válida (1 Co 5:4). Não significa que seja uma decisão com a qual todos na assembleia concordem.

Alguém perguntou: “Quem é que decide o que deve ou não ser apresentado à assembleia para ser decidido?”.

Nossa resposta é: o Senhor. Ele é a Cabeça da igreja e a assembleia deve buscar a direção dEle (Cl 2:18). Os irmãos responsáveis podem ter de analisar uma questão para obter os fatos, mas, uma vez que estejam certificados daquilo, é a Palavra de Deus quem decide o que deve ser feito.

Alguns acham que os irmãos devem simplesmente formular uma proposta para a assembleia, e quando a trouxerem diante da assembleia caberá a esta decidir por maioria. Esta ideia não passa de democracia [a Bíblia não é democrática]. Apesar de existir alguma verdade nisto, os irmãos que assumem a liderança são responsáveis por se certificarem de que a assembleia esteja sendo guiada em um curso de ação fundamentado na Bíblia, independente de todos concordarem ou não. Se não fosse assim, o julgamento piedoso e bíblico de irmãos mais velhos e responsáveis (que entendem os princípios e sabem que caminho tomar) poderia ser neutralizado pelas irmãs, pelos menos experientes e também por pessoas com sentimentos partidários. Deste modo o julgamento bíblico ficaria sujeito àqueles com menor experiência ou discernimento, ou que não fossem imparciais quanto aos assuntos da assembleia. Algo assim obviamente não seria correto. Alguns parecem pensar que os irmãos não poderiam agir até receberem um “OK” dessas pessoas, mas isto equivaleria ao povo controlar seus líderes, o que é a raiz da democracia. Muitos tropeçaram nisto quando os anciãos procuraram levar adiante um julgamento bíblico enquanto alguns discordavam da ação.

Isto não significa que os anciãos tomem decisões administrativas na assembleia sem que os demais santos possam opinar. É possível que irmãos mais novos venham a ter a mente do Senhor em uma determinada questão quando os irmãos mais velhos a deixaram passar (Jó 32-33). Em casos assim os irmãos mais velhos deveriam aceitar de bom grado a luz lançada sobre a questão, e que talvez eles não tivessem percebido. Mas na vida normal da assembleia são os irmãos mais velhos e experimentados que compreendem os princípios envolvidos e que têm sobre si o peso moral nestas questões de assembleia.

Nada pode ser oficialmente decidido sem que a assembleia tenha a oportunidade de ter sua consciência exercitada com o assunto, e é por isso que os anciãos procuram atingir a consciência de todos na assembleia ao exporem o assunto a eles (At 15:22). Os irmãos que lideram deveriam ser sensíveis a qualquer objeção legítima que outros na assembleia possam levantar. Mas no final serão eles os responsáveis, como “o anjo” da igreja, por agirem para a glória de Deus (Ap 2-3). Mas não será uma decisão tomada pela assembleia até que seja feita em assembleia, naquilo que às vezes é chamado de reunião para disciplina (Mt 18:19-20; 1 Co 5:4).

Ao formularem as questões para decisão da assembleia, os líderes responsáveis devem procurar tocar a consciência de todos na assembleia local, de modo que todos possam ser exercitados no assunto. Todavia a assembleia pode não agir segundo a consciência de alguns. Como já foi mencionado, isto ocorre porque estes talvez sejam novos na fé e suas consciências podem não estar suficientemente iluminadas por princípios bíblicos para serem capazes de formar um juízo correto. Pode ser o caso também de existirem pessoas mundanas e sem discernimento espiritual entre os irmãos, ou serem tendenciosas em relação à questão. Em todo caso, o julgamento de pessoas assim deve ser descartado. As Escrituras não exigem que se busque a satisfação de todos na assembleia para que uma decisão seja acertada.

Nestes últimos dias, quando a vontade do homem está cada vez mais evidente em sua tentativa de prevalecer na igreja, não podemos esperar obter unanimidade nos julgamentos feitos pela assembleia. Foi o que aconteceu no julgamento ocorrido em Corinto. Em 2 Coríntios 2:5 diz:

Se alguém me contristou, não me contristou a mim senão em parte [...] a vós todos” (A versão J. N. Darby coloca em dúvida a originalidade das palavras entre chaves). Aparentemente nem todos na assembleia em Corinto ficaram contristados com o pecado que havia no meio deles. Apesar disso, mesmo assim a assembleia levou adiante a ação para a glória de Deus.

Ao lidar com uma situação de heresia, será muito raro -- ou até impossível -- obter a aprovação da pessoa que a assembleia está julgando. Além disso, seus familiares e amigos podem protestar, portanto dificilmente se conseguirá unanimidade. J. N. Darby escreveu: “A unanimidade é absurda, é uma negação do poder e da operação do Espírito, e claramente contrária à Palavra de Deus. Primeiro, ela é absurda porque até a questão ter sido decidida a pessoa que está sendo acusada faz parte da assembleia, e você não vai conseguir convencê-la a julgar-se a si mesma guiada pelo Espírito”.

Ocasionalmente decisões foram tomadas pela assembleia quando alguns poucos irmãos não estavam presentes na reunião de irmãos ou na reunião da assembleia, quando a decisão foi tomada. Isso levou alguns a pensarem que aquela não poderia ter sido uma decisão válida da assembleia e ratificada no céu. O argumento destes era:

“Mas os irmãos não estavam todos presentes para decidir!”. Mais uma vez isto não passa de uma ideia democrática. A assembleia agindo dentro de sua capacidade administrativa sem que todos estejam presentes não é uma ideia estranha às Escrituras. Vemos o princípio registrado em 1 Coríntios 15:5, em conexão com o ofício do apostolado. Ali diz: “E que foi visto por Cefas, e depois pelos doze”. Quando comparamos a passagem com Lucas 24:34-48 e João 20:19:24 descobrimos que quando o Senhor apareceu a eles estavam presentes apenas dez dos apóstolos, todavia eles são chamados de “os doze”. Judas havia se enforcado e Tomé não estava ali. De acordo com Atos 1, Matias ainda não fazia parte dos “doze”. A sua escolha não aconteceu senão depois de o Senhor ter completado todas as suas aparições como ressuscitado (nos 40 dias) e ter subido aos céus. Todavia, aqueles reunidos são, mesmo assim, chamados de “os doze”. Disto aprendemos que “os doze” é um termo usado para designar o ofício administrativo que eles exerciam e a autoridade que tinham para agirem como tal. Nas epístolas aos Coríntios, onde a função e ordem da assembleia nos são apresentadas, o princípio ensinado ali está bem de acordo. Também é digno de nota que as aparições do Senhor às mulheres não são citadas em 1 Coríntios 15, pois a administração da assembleia é dada aos irmãos responsáveis. Isto demonstra que a assembleia, quando age em sua capacidade administrativa, não precisa contar com a presença de todos para que suas decisões sejam tomadas.

A assembleia não é uma instituição democrática que toma suas decisões por meio de voto majoritário, permitindo que cada pessoa participe da decisão com respeito ao assunto envolvido. Uma vez escutamos um irmão mais jovem dizer: “Eu tenho tanto direito de me expressar aqui quanto ele”, referindo-se a um irmão mais velho e sério, que havia se dedicado ao cuidado da assembleia por 50 anos. Fomos obrigados a dizer ao jovem que aquilo não era assim. Existe uma coisa chamada ‘peso moral’, e isto é obtido por meio de anos de caminhar em fidelidade ao Senhor e cuidando dos santos. Os que ocupam uma posição de liderança e guiam a assembleia levam sobre si o peso da assembleia nas questões administrativas. Por exemplo, poderia ser o caso de seis ou sete irmãos mais jovens desejarem algo, mas três ou quatro irmãos mais velhos e sérios pensarem o contrário. Já que o julgamento dos irmãos mais velhos deve ser respeitado, pois eles levam sobre si o peso moral na assembleia, o que o Senhor deseja é que os jovens se submetam a tal julgamento, caso tenham uma opinião contrária. Eles devem se satisfazer em seguir a liderança espiritual de seus irmãos mais velhos.

RESUMINDO: A resposta breve a esta questão, de quando nem todos concordam numa assembleia, é que a assembleia não é uma democracia, e a unanimidade não é necessária para se tomar uma decisão em assembleia. Aqueles que lideram levam sobre si o peso da responsabilidade nas ações administrativas da assembleia. Eles são responsáveis por garantir que a assembleia siga caminhando de forma bíblica, quer todos concordem ou não com uma determinada decisão.

Continua em: 
Capítulo Oito - O que fazer se a assembleia tomar uma decisão errada?

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Capítulo Seis - Como pode ser o lugar certo com tantas coisas erradas?


PERGUNTA: Como este pode ser o lugar correto quando existe toda sorte de coisas erradas acontecendo? Há disputas, divisões, mundanismo etc. Se o Senhor estivesse verdadeiramente no meio Ele não permitiria que tais coisas acontecessem.


RESPOSTA: O problema é que transformamos a tolerância para com o mal em uma assembleia no critério para julgar se ela está ou não reunida no terreno correto. Certamente entendemos como alguém pode chegar a tal conclusão: eu e você naturalmente acharíamos que se o Senhor estivesse verdadeiramente no meio de um determinado grupo de cristãos, ali não existiriam problemas. Ele não permitiria que aquele grupo seguisse adiante, pois se o fizesse estaria sendo condescendente com o erro -- o que Ele não faria.

Bem, não somos os primeiros a levantar tal questão. Há muito tempo Gideão perguntou: “Ah, Senhor... se o Senhor está conosco, por que aconteceu tudo isso?” (Jz 6:13). Tal questão resulta de uma falsa premissa. A verdade é que o Senhor está no meio dos “santos reunidos” para sancionar esse terreno eclesiástico, o que não significa que Ele esteja sancionando a condição dessas pessoas. As Escrituras fazem distinção entre as duas coisas, e precisamos fazer o mesmo. Se nós as enxergarmos como uma coisa só, acabaremos chegando a conclusões equivocadas. Isto vale também para a vida pessoal e a vida em assembleia. Por exemplo, como crentes, o Senhor está conosco o tempo todo no sentido individual (Mt 28:20; Hb 13:5), mas não podemos concluir que Ele aprove tudo o que fazemos. E, evidentemente, o mesmo ocorre com a assembleia.

Isto está ilustrado em Malaquias. Como você sabe, Malaquias teve o solene dever de entregar a última mensagem de Deus ao Seu povo terreno -- os judeus -- antes da vinda do Senhor. Nos dias de Malaquias o povo estava na posição correta, porém na condição errada. Havendo retornado da Babilônia para Jerusalém, o centro divino daqueles dias, eles estavam no lugar correto. Por isso contavam com a presença do Senhor “com” eles (Ag 2:4-5). Mas eles estavam na condição errada, e por isso Malaquias foi enviado para exercitar o povo a este respeito. Podemos pensar em como o Senhor poderia habitar entre eles quando existia ali toda sorte de coisas erradas acontecendo, mas a razão é que
a presença do Senhor com o Seu povo (coletivamente) não significa que Ele esteja aprovando sua condição.

No Novo Testamento encontramos a mesma coisa. As condições na assembleia em Corinto eram deploráveis. Existia todo tipo de coisas ruins acontecendo ali -- divisões, fornicação, má doutrina e outras que abalavam os fundamentos da fé. Mesmo assim o apóstolo Paulo escreveu dirigindo-se a eles como “a igreja de Deus”. Eles continuavam a ser reconhecidos como uma assembleia “de Deus” no que diz respeito ao terreno que ocupavam. Deus os reconhecia assim. No capítulo 5 Paulo afirma que, quando “reunidos”, era “com o poder de Jesus, nosso Senhor”, que eles eram vistos. De acordo com Mateus 18:18-20 este poder ou autoridade só é possível com o Senhor estando no meio. Portanto, aquela assembleia não apenas era reconhecida por Deus, mas o Senhor estava em seu meio. Repare que ali não diz “Onde dois ou três, em boas condições, estiverem reunidos... aí estou eu no meio deles”. Não se trata de algo condicional.

Mais uma vez nos questionamos como o Senhor poderia mesmo assim Se identificar com uma assembleia que estivesse tão errada. A questão é que o Senhor não aprovava o mal em Corinto; Ele não iria suportá-lo indefinidamente, pois se assim o fizesse estaria passando uma mensagem equivocada para a comunidade. Mas o ponto da carta de Paulo é que o Senhor estava dando a eles a chance de se arrependerem. Cedo ou tarde o apóstolo precisaria agir em nome do Senhor e tratar em juízo com aquela assembleia caso eles não se corrigissem (1 Co 4:21; 2 Co 1:23). Como você sabe, o aviso dado na primeira epístola foi recebido, e os santos em Corinto se arrependeram e corrigiram as coisas que estavam erradas (2 Co 7:6-16). Isto demonstra que o Senhor não remove o candeeiro rapidamente de um lugar, mas dá a chance de arrependimento quando as coisas estão erradas (Ap 2:21). É interessante notar que em Apocalipse 2:5 a palavra “brevemente”, que aparece na versão Almeida Corrigida, não consta do texto original grego. Ali deveria estar simplesmente “A ti virei, e tirarei do seu lugar o teu castiçal, se não te arrependeres”.

A partir da falsa premissa de que o Senhor não poderia estar no meio de uma assembleia que estivesse praticando o erro vem a ideia de que nós deveríamos abandoná-la em razão de sua condição ruim. O argumento é que, se o Senhor não está ali, nós também não deveríamos estar, pois não gostaríamos de estar onde o Senhor não está no meio. Alguns que queriam abandonar a assembleia de qualquer maneira usaram este falso argumento como uma desculpa conveniente para uma saída rápida. A velha ladainha é: “O mal está aqui e o Senhor certamente não quer que eu esteja em comunhão com o
mal!”.

O erro está em imaginarmos que exista um determinado grau de problemas e males que possa ser tolerado em uma assembleia, e que se esse limite for ultrapassado a assembleia, de algum modo, perderá misticamente seu status de estar reunida sobre o terreno divino. Já que cada um tem uma ideia diferente de que grau seja esse, fica para cada um decidir quando é que ele acha que a assembleia já não está verdadeiramente congregada ao nome do Senhor. Isto nos faz lembrar da época quando os juízes governavam. No final daquele livro diz: “Naqueles dias não havia rei em Israel; porém cada um fazia o que parecia reto aos seus olhos” (Jz 21:25). É triste admitir, mas coisas assim levam à confusão.

Muitos têm perguntado: “Quando é que uma pessoa deveria abandonar uma assembleia?” A resposta é simples: você sai quando o Senhor sair. Mas quando é que isto acontece? Nos dias dos apóstolos seria quando a assembleia deliberadamente se recusasse a corrigir seus erros e um apóstolo fosse obrigado a tratar do assunto com seu juízo apostólico e agindo pelo Senhor (1 Co 4:21; 2 Co 1:23). Hoje seria quando outra assembleia reunida ao nome do Senhor, depois de muita insistência e paciência, deixasse oficialmente de reconhecer aquela como sendo uma assembleia congregada sobre o terreno divino. Esta seria uma decisão tomada em nome do Senhor (Mt 18:18-20).

Se acharmos que devemos deixar uma assembleia por causa de certas coisas que ocorrem ali, mesmo ela não tendo sido formalmente repudiada por outra assembleia reunida ao nome do Senhor, estaremos fazendo algo à revelia do Senhor. Seria o mesmo que dizer que somos mais santos que o próprio Senhor. Se Ele ainda pode estar no meio de uma assembleia em erro (ainda que entristecido por causa da condição dela), nós também podemos permanecer ali.

O que podemos fazer até que o problema seja corrigido, ou a assembleia seja repudiada, é “chorar” por causa do péssimo estado da assembleia. Pode ser que o Senhor interfira em uma ação administrativa e trate do problema ou das pessoas envolvidas com o erro (1 Co 5:1-2). Mas as Escrituras não indicam que devamos deixar uma assembleia por causa de sua condição ruim. W. Potter escreveu:

Suponha que esta assembleia tenha chegado a uma condição deplorável. O que devemos fazer é nos humilharmos diante do Senhor, e não sairmos dela... Se o Espírito de Deus nos reuniu ao nome do Senhor, não ousaríamos abandonar esta posição até termos a Palavra de Deus neste sentido”.

A terceira epístola de João nos dá luz a este respeito. As condições na assembleia local onde Gaio morava eram terríveis -- para dizer o mínimo. Um ancião naquela assembleia (Diótrefes) havia deixado seu papel de guiar, cuidar e apascentar o rebanho para assumir o controle da assembleia e governá-la de modo carnal. Ele agia como uma locomotiva desgovernada. O resultado era que muitos acabavam machucados por sua brutalidade e seu modo egoísta de ser (veja Jeremias 10:21). Os seis males de Diótrefes eram:


Ele amava a preeminência, havendo assumido o exclusivo controle da assembleia.

Ele censurou uma carta do apóstolo João endereçada à assembleia.

Ele acusava injustamente os apóstolos com palavras maliciosas.

Ele se recusava a receber obreiros que viajavam trabalhando na Palavra e na doutrina.

Ele impedia os que queriam receber os obreiros.

Ele excomungava as pessoas injustamente.

Poderíamos perguntar: “Em tais condições, o que poderíamos fazer?” (Sl 11:3). Você irá reparar que existem duas coisas que são notórias por sua ausência na epístola: Primeiro, João não diz a Gaio para abandonar a assembleia por causa das coisas terríveis que estavam acontecendo ali. João não disse a ele: “Gaio, você não precisa aguentar isso; simplesmente pegue suas coisas e saia”.

Não, aquela não era uma opção. Segundo, João não diz a Gaio para reunir Demétrio e alguns outros irmãos dali e colocarem aquele homem fora de comunhão (excomungarem). Não que aquilo não devesse ser feito -- teria sido a coisa certa a fazer. Mas esta epístola aborda a questão em uma assembleia quando as condições haviam chegado a tal ponto que não existia qualquer poder para lidar com o mal. (Sendo esta uma “terceira” epístola, ela apresenta condições que haviam se desenvolvido a partir do que é encontrado nas “segundas” epístolas). De nada adiantaria lutar contra Diótrefes, pois aqueles que tentaram fazê-lo acabaram eles próprios fora de comunhão! Portanto, tentar excomungá-lo não era uma opção.

Quando as coisas chegam a tal ponto em uma assembleia, esta epístola nos mostra que ainda existe um recurso -- o próprio Senhor. Sendo Ele a Cabeça da igreja, naquela época Ele podia enviar um apóstolo para lidar com o problema. Isto é visto nas palavras de João: “Se eu for, trarei à memória as obras que ele faz” (vers. 10, 14). João planejava ir àquela assembleia e tratar com Diótrefes em juízo apostólico. Seria uma intervenção divina, pois sua ação como apóstolo seria na realidade uma extensão da autoridade do Senhor. Hoje não existem apóstolos na terra para intervirem em nome do Senhor desta maneira, mas o Senhor pode ainda intervir administrativamente -- em uma maneira providencial -- em situações difíceis nas assembleias. Talvez isto, em nossos dias, seria o equivalente à ida de João naquele tempo. Assim como Gaio e todos os santos que estavam passando por um exercício semelhante naquela assembleia, devemos aguardar o Senhor agir no Seu devido tempo.


Enquanto isso João disse a Gaio: “Amado, não sigas o mal, mas o bem”, ou seja, não caia no mal de Diótrefes. Parece que o apóstolo se antecipou à dúvida que Gaio poderia ter de como agir na difícil situação pela qual a assembleia passava, e por isso João aponta para Demétrio.

“Todos dão testemunho de Demétrio, até a mesma verdade”, como se estivesse dizendo, “ele é o exemplo que você deve seguir”. Isto é maravilhoso. “Todos”, inclusive Diótrefes! Isto significa que Demétrio vivia de tal maneira que tinha um bom testemunho até de Diótrefes. Todavia João acrescenta: “até a mesma verdade”. Isto indica que Demétrio não havia comprometido nem um pouco a verdade. Significa que ele havia encontrado uma maneira de seguir adiante na presença de Diótrefes e ainda assim viver de modo a agradar ao Senhor. Isto nos mostra que existe uma maneira de seguirmos em frente, mesmo nas circunstâncias mais difíceis em uma assembleia. A solução está em não abandoná-la.

RESUMO: A existência de problemas ou do mal em uma assembleia não significa que aquela assembleia não esteja sobre terreno divino, mas que está em uma condição ruim. Se uma assembleia continuar no erro, ela eventualmente acabará formalmente repudiada e não estará mais reunida ao nome do Senhor. Enquanto isto não acontece, o Senhor continuará em seu meio, ainda que certamente entristecido por aquela condição deprimente. Nossa responsabilidade é permanecer ali até o Senhor intervir para corrigir as coisas, ou até que aquela assembleia seja formalmente deixada de lado.

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Capítulo Sete - Como uma decisão pode ser tomada sem unanimidade?

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Capítulo Cinco - Como podemos dizer que só existe um centro de reunião?


PERGUNTA: Como podemos dizer que só existe um grupo de cristãos que estão corretamente congregados numa base divina, e que somente eles têm o Senhor em seu meio, quando existem tantos grupos de cristãos piedosos e devotados que se reúnem com motivos sinceros? Isto soa extremamente preconceituoso e sectário.


RESPOSTA: Ensinar que o Espírito de Deus possui um centro de reunião no cristianismo no mundo hoje -- um lugar onde o Senhor colocou o Seu nome e onde o Espírito de Deus está congregando pessoas -- é provavelmente o ponto mais odiado dentre todas as questões que as pessoas levantam. Pode parecer bem preconceituoso e sectário, mas, quando você considera o que as Escrituras ensinam a respeito do terreno de reunião para os cristãos, a única conclusão honesta a que você poderá chegar é que deveria existir apenas um centro divinamente reconhecido de reunião na terra. Ter dúvidas quanto à possibilidade de existir um centro divino de reunião no cristianismo é perder de vista alguns princípios importantes da Palavra de Deus a respeito deste assunto. Portanto, a fim de responder adequadamente, precisamos voltar a estabelecer os princípios básicos que envolvem o congregar, e deixarmos que as Escrituras tirem suas próprias conclusões para nós.

DEUS DESEJA QUE O SEU POVO SEJA UM ÚNICO TESTEMUNHO

Antes de tudo, a Palavra de Deus nos diz que o PLANO de Deus no cristianismo é que “Jesus devia morrer... também para reunir em um corpo os filhos de Deus que andavam dispersos” (Jo 11:51-52), e então haveria “um rebanho” (Jo 10:16). Antes de ir para a cruz o Senhor orou com este objetivo, dizendo: “Pai santo, guarda em teu nome aqueles que me deste, para que sejam um, assim como nós... Para que todos sejam um, como tu, ó Pai, o és em mim, e eu em ti; que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste” (Jo 17:11, 21). Embora estes versículos em João não falem diretamente da verdade da unidade do corpo de Cristo, mas sim da unidade da família de Deus, eles demonstram claramente que o desejo de Deus para o Seu povo é que sejam encontrados juntos em uma unidade visível na terra.

A primeira vez que o Senhor revelou os Seus pensamentos de uma unidade prática manifestada entre o Seu povo na igreja foi em Mateus 18:20. Ali diz: Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em [ao] meu nome, aí estou eu no meio deles. Ele não queria que o Seu povo estivesse meramente “reunidos” onde Ele estava no meio, mas unidos. Assim o Senhor estava indicando que todos aqueles que o Espírito de Deus viesse a reunir ao Seu nome, onde quer que estivessem na face da terra, estariam unidos em uma unidade visível. Ele não quis dizer que eles deveriam estar reunidos geograficamente em um lugar (como acontecia no judaísmo com Jerusalém), mas que agissem unanimemente nas diversas localidades onde o Espírito os reunisse, a fim de darem uma expressão universal do fato de serem um.

Você pode achar que estou enxergando mais na palavra “reunidos” do que o Espírito de Deus tinha a intenção de incluir nela, e é verdade que, se tivéssemos apenas este versículo de Mateus 18:20 falando do assunto de reunir, talvez não tivéssemos uma base para afirmar isto. Mas quando abrimos o livro de Atos e as epístolas, e interpretamos esta passagem à luz de todo o teor da revelação cristã, podemos ver que o Senhor estava indicando a verdade da unidade da igreja em testemunho. Ela é apenas pincelada em Mateus 18 porque os discípulos ainda não tinham o Espírito Santo, e não seriam capazes de entender a verdade contida ali (Jo 14:25-26; 16:12). O Senhor agiu assim em diversas ocasiões de Seu ministério, não dando mais que a semente de alguma verdade, e depois deixando que ela fosse desenvolvida por intermédio dos apóstolos depois de o Espírito Santo haver sido dado.

À
medida que o evangelho alcançava muitas terras, e à medida que muitos eram convertidos, surgiriam naturalmente diversas reuniões espalhadas pela terra, mas o Senhor queria que elas continuassem fazendo parte de uma só comunhão e testemunho. Isto é visto na observação feita pelo apóstolo Paulo aos Tessalonicenses: “Porque vós, irmãos, haveis sido feitos imitadores das igrejas de Deus que na Judéia estão em Jesus Cristo” (1 Ts 2:14). O Senhor não tinha a intenção de que Seu povo formasse grupos independentes, mas que existisse um só rebanho -- uma comunhão universal dos santos na terra. É a esta comunhão que todos os cristãos são chamados (1 Co 1:9).

DEUS POSSUI UM TERRENO NO QUAL ELE REÚNE OS CRISTÃOS


Um segundo ponto a ser observado é que Deus possui um LUGAR -- um terreno eclesiástico -- na terra “onde” Ele gostaria de ter os cristãos reunidos para expressar a verdade de que há um só corpo. Este Centro de reunião é o próprio Cristo. O mesmo versículo que citei (Mateus 18:20) diz: Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em [ao] meu nome, aí estou eu no meio deles. Como já foi mencionado, este lugar de reunião no cristianismo não é um centro geográfico literal, mas um terreno espiritual envolvendo princípios das Escrituras que têm a ver com o modo como os cristãos devem se reunir para a adoração e o ministério. Aqueles que ocupam este terreno não estão reunidos aos princípios, mas a uma Pessoa - - o Senhor Jesus Cristo.

Este centro de reunião é um lugar da escolha do Senhor, onde Ele colocou o Seu nome e onde Ele reúne os crentes. Repare que o versículo diz “onde” e não “onde quer que”, como alguns cristãos gostariam de interpretar. Muitos acham que este versículo esteja simplesmente dizendo que quando e onde quer que um grupo de cristãos se reúna -- seja para tomar um café em uma lanchonete, para alguma atividade recreativa etc. -- eles contam com a presença do Senhor com eles coletivamente. Certamente é verdade que quando cristãos se encontram, independente do objetivo que tenham em mente, a presença do Senhor está com eles individualmente, pois Ele prometeu: “eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos” (Mt 28:20) e “não te deixarei, nem te desampararei” (Hb 13:5). Mas não é disto que o versículo em Mateus 18:20 está falando. Existe uma diferença nas Escrituras entre a presença do Senhor com o Seu povo individualmente e a presença do Senhor com um grupo de crentes coletivamente, como uma assembleia reunida para adoração, ministério e decisões administrativas. É a este aspecto coletivo que Mateus 18 está se referindo.

É
importante considerar o contexto na interpretação da Bíblia. Se atentarmos para o capítulo em Mateus 18, veremos que nos versículos que culminam no versículo 20 o Senhor estava falando da assembleia em sua capacidade administrativa de tomar decisões e agir. O capítulo tem a ver com a autoridade da assembleia local para executar tais ações, pois o próprio Senhor está em seu meio. O Senhor está ali no meio sancionando a própria existência daqueles reunidos pelo Espírito ao Seu nome, e também suas ações administrativas. Tendo isto em mente, insisto em acrescentar que a presença do Senhor no meio daqueles que Ele reuniu não sanciona a condição dessas pessoas -- que pode ser péssima -- e sim o terreno sobre o qual elas estão reunidas. A Bíblia não fala de qualquer lugar que escolhermos, mas “onde” for o lugar escolhido por Ele. É por isso que ele é frequentemente chamado de “o lugar de Sua escolha”.

Lucas 22:7-10 também estabelece o mesmo ponto: existe um lugar na terra (um terreno espiritual) “onde” Deus gostaria que os crentes estivessem congregados. O Senhor Jesus estava para instituir a Ceia do Senhor -- o partir do pão (Lc 22:19-20; 1 Co 10:16-17, 11:23-26) -- e desejava que Seus discípulos fizessem isso no lugar escolhido por Ele. As coisas em Israel naquela época estavam fora de ordem e havia muita corrupção, que ia dos principais sacerdotes e anciãos até o cidadão comum. Como resultado disso, o Senhor não foi reconhecido como seu Messias. A verdade é que eles se preparavam para matá-Lo! (Lc 22:2). O povo seguia celebrando a Páscoa, mas ao mesmo tempo rejeitava Aquele que era o cumprimento da Páscoa. Portanto, havia muitas casas em Jerusalém naquela noite em que a festa era celebrada, mas havia apenas um aposento onde o Senhor estava presente -- o lugar que Ele havia designado para Seus discípulos. A cristandade hoje igualmente encontra-se fora de ordem, e como resultado há muitos lugares onde os cristãos se reúnem, porém o Senhor não está ali no sentido coletivo para sancionar o terreno no qual eles congregam.

Hebreus 13:13 nos fala que o lugar escolhido pelo Senhor -- onde Ele está no meio -- é “fora do arraial”. O “arraial” é uma palavra que o Espírito de Deus usa para indicar o judaísmo e todos os princípios e práticas judaicas. Os cristãos costumam perder este ponto de vista e acabam adotando em seus lugares de adoração muitas coisas que estão conectadas à adoração judaica. Eles ignoram o claro ensino das Escrituras que indica que o tabernáculo é uma figura do verdadeiro santuário, ao qual agora temos acesso pelo Espírito (Hb 9:8-9, 23-24). No entanto, acabaram usando o judaísmo como um padrão para suas organizações eclesiásticas. Erigiram grandes templos e catedrais “feitos por mãos de homens” (At 17:24-25), emprestando assim muitas coisas do Antigo Testamento em seu sentido literal como um padrão para sua adoração. Eles perderam completamente de vista o fato de que o verdadeiro terreno de reunião e adoração cristã é uma maneira totalmente nova de se aproximar de Deus “em espírito e em verdade” (Jo 4:23-24; Hb 10:19-20). Tal terreno encontra-se totalmente fora dos princípios e práticas judaizantes. Qualquer pessoa que estivesse procurando pelo lugar da escolha do Senhor teria de procurar fora de todos esses lugares da cristandade -- da basílica de São Pedro, em Roma, à menor capela evangélica -- pois todos esses lugares trazem, em maior ou menor escala, os paramentos do judaísmo mesclados na estrutura de seus cultos de adoração.

1 Coríntios 10:21 nos diz que existe algo chamado de “mesa do Senhor”. Não se trata da mesa literal que os irmãos têm em seus locais de reunião, sobre a qual colocam os emblemas da Ceia do Senhor. Trata-se de um termo simbólico que denota o lugar no qual o Espírito Santo reúne os crentes ao nome do Senhor Jesus. É ali que a unidade do corpo é exibida e onde Cristo está no meio. Nas Escrituras uma “mesa” simboliza comunhão. No caso da mesa do Senhor ela simboliza o verdadeiro terreno de comunhão que Deus possui para todos os cristãos, onde a autoridade do Senhor é reconhecida e a ela todos se sujeitam. É por esta razão que é chamada de “mesa do Senhor”.

Existe uma figura desta verdade do divino centro de reunião em Deuteronômio 12, à qual já fiz referência. O Senhor possuía um lugar no qual Ele reunia o Seu povo, Israel: “ Então haverá um lugar que escolherá o SENHOR vosso Deus para ali fazer habitar o seu nome” (vers. 11). Os filhos de Israel deveriam levar suas ofertas e sacrifícios àquele lugar (Dt 12:5-6), celebrar suas festas anuais ali (Dt 16:2, 6, 11, 15-16), e ter seus problemas resolvidos pelos sacerdotes, levitas e juízes que estavam ali (Dt 17:8). No entanto é significativo o fato de que em todas as referências feitas em Deuteronômio sobre o lugar escolhido pelo Senhor, nunca é dito onde seria. À medida que a história de Israel se desdobra nas páginas da Palavra de Deus, aprendemos que este lugar seria Jerusalém (Sl 78:68; 1 Rs 11:13, 32, 36; 12:20; 14:21; 15:4 etc.). Em Deuteronômio não é feita menção sobre onde seria porque o Senhor queria que o Seu povo fosse exercitado em procurá-lo quando chegassem à terra. Do mesmo modo, no cristianismo nenhuma das passagens que vimos no Novo Testamento nos diz onde é o lugar -- este é um exercício para cada cristão. Isto está ilustrado no pedido que Pedro e João fazem ao Senhor: “Onde queres que a preparemos?” (Lc 22:9).

EXISTE UM DIVINO 'REUNIDOR’ QUE LEVA OS CRENTES AO LUGAR ESCOLHIDO POR DEUS

Tendo estabelecido a partir das Escrituras que o PLANO de Deus é reunir o povo de Deus em um mesmo terreno, e que Ele possui um LUGAR onde gostaria de ter os Seus juntos, Mateus 18:20 indica que Ele tem o PODER de fazê-lo. Existe um divino Reunidor -- o Espírito Santo -- que leva os crentes exercitados nisto ao lugar da Sua escolha.

A quem mais o Senhor confiaria a tarefa de reunir o Seu povo ao Seu nome além do Espírito de Deus? Apesar de o Espírito não ser diretamente mencionado nesta passagem, fica claro que Ele é o divino Reunidor. Isto é visto das palavras “estiverem... reunidos”. O Senhor não disse “onde dois ou três se reunirem”, como erroneamente aparece na NVI e outras versões modernas. “Estiverem...reunidos” é voz passiva e aponta para o fato de existir um poder reunidor fora das próprias pessoas, o qual esteve envolvido na reunião delas sobre aquele terreno. Isto demonstra que o divino terreno de reunião não é uma associação voluntária de crentes. É verdade que devem existir vontade e exercício pessoal da parte daqueles que são reunidos pelo Espírito para que sejam encontrados ali no lugar onde Cristo está no meio, mas em uma última instância é Ele próprio quem reúne.

Entendo que a verdade da obra do Espírito representada nas palavras “estiverem... reunidos” tem sido grandemente contestada. Alguns tentam nos dizer que isto de ser obra do Espírito Santo é algo que só é ensinado pelos irmãos mais recentes, querendo com isto dizer que se trata de uma ideia nova. Outros procuram verificar no texto grego na tentativa de provar não ser assim. A verdade é que os escritos de C. H. Mackintosh, F. G. Patterson, J. A. Trench, H. Smith, além de muitos outros do século 20, já ensinavam que as palavras “estiverem... reunidos” realmente se referem à obra do Espírito Santo. Por exemplo, Hamilton Smith escreveu: “Para usar de uma ilustração simples, vejo uma cesta de frutas sobre a mesa. Como foi que elas chegaram ali? As frutas foram reunidas; não ficaram juntas por seu próprio esforço”. A palavra grega usada para “reunidos” é “sunago”, que significa literalmente “juntar” e poderia ser traduzida como “juntamente direcionados”, e tudo isso sugere um Reunidor. O dicionário grego de Strongs define que a palavra “sunago” (#4863) significa “direcionar juntos” ou “coletar”. O dicionário grego Vines define “sunago” como “reunir ou trazer juntamente”.

J. N. Darby escreveu: “Ele [Cristo] é o único centro de reunião. Os homens podem criar confederações entre si, colocando muitas coisas como alvo ou objeto de suas reuniões, mas a comunhão dos santos não pode ser conhecida a menos que cada linha venha a convergir em direção ao Centro vivo [Cristo]. O Espírito Santo não reúne os santos em torno de meras opiniões sobre o que é a igreja, por mais que estas sejam verdadeiras, ou sobre aquilo que a igreja foi ou possa ser na terra, mas sempre reúne em torno daquela Pessoa bendita, que é o mesmo ontem, hoje e eternamente. Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles (Mt 18:20)”.

Lucas 22:7-10 dá respaldo ao fato de que existe um divino Reunidor. Ali diz: “Eis que, quando entrardes na cidade, encontrareis um homem, levando um cântaro de água; segui-o até à casa em que ele entrar” . O Espírito de Deus é visto aqui na figura de “um homem” carregando um cântaro de água. Muitas vezes nas Escrituras o Espírito de Deus é visto como um homem anônimo trabalhando nos bastidores. Isto porque não é o objetivo do Espírito de Deus chamar atenção para Si mesmo (João 16:13-14), e esta é a razão pela qual Ele não é diretamente mencionado em Mateus 18:20. Ele não assume um lugar de proeminência no cristianismo, mas trabalha nos bastidores guiando as almas exercitadas àquele terreno bíblico onde Cristo está no meio dos que estão assim congregados. Neste caso Ele guiou os discípulos ao lugar escolhido pelo Senhor, onde eles poderiam estar com Ele para a ceia. A “água” nas Escrituras costuma significar a Palavra de Deus (Ef 5:26). Assim aprendemos que o Espírito de Deus usa os princípios da Palavra de Deus para guiar os crentes ao lugar escolhido pelo Senhor.

Homens bem intencionados têm procurado reunir o povo de Deus e só causaram problemas. Por ignorarem a verdade da reunião apresentada nas Escrituras, eles desviaram os cristãos para grupos e seitas denominacionais e os encorajaram a frequentar “a igreja de sua escolha”. O resultado é que os crentes acabaram dispersos em mil direções. Isto certamente não é obra do Espírito Santo.

A CONCLUSÃO LÓGICA DAS ESCRITURAS

Vamos agora reunir tudo e deixar que as Escrituras nos deem a resposta.

Primeiro, Deus gostaria que todos os cristãos estivessem juntos em um só testemunho prático, mesmo que estivessem em muitas localidades diferentes na face da terra.

Segundo, Deus tem um lugar e uma maneira -- uma posição ou terreno eclesiástico -- onde Ele gostaria que os cristãos expressassem esta unidade congregados para adoração e ministério, e para ações administrativas.

Terceiro, existe um divino Reunidor (o Espírito de Deus) que exercita os crentes nestes princípios bíblicos de reunião e os encaminha a este lugar escolhido pelo Senhor.

A única conclusão lógica que podemos tirar destes princípios é que a presença do Senhor (no sentido coletivo da palavra, conforme temos falado -- Mateus 18:20) só poderia estar em um único lugar. Se isto for verdade, então o Senhor não poderia estar em todos os lugares onde os cristãos se reúnem -- mesmo que eles tivessem boas intenções. É algo bastante simples: se o senhor garantisse a Sua presença nos muitos lugares onde os cristãos se reúnem, Ele estaria sendo condescendente com essas falsas posições. W. Potter, respeitado por seu ensino das Escrituras, afirmou: “Suponha que hoje o Senhor agraciasse com Sua presença essas diferentes denominações. O que Ele estaria fazendo? Ele estaria sancionando aquilo que é contrário a Si mesmo. Ele não poderia fazer tal coisa”.

Potter acrescentou: “Não se trata de meramente insinuar que o Senhor não está no meio de quaisquer outros irmãos reunidos. Ele definitivamente não está”.

Ora, isto pode soar extremamente limitado e exclusivista, mas se você estiver honestamente buscando a verdade não irá querer discutir com a Palavra de Deus. Lembre-se de que estas coisas não são ideias minhas; elas são a única conclusão cabível à qual as Escrituras nos conduzem. Se você acha que a verdade de reunir é muito exclusivista, deixe-me perguntar: “Quantas maneiras há para uma pessoa ser salva?”. Uma. O que você diria disto? Diria que é muito limitado e exclusivista? Não, porque é a verdade. A própria natureza do cristianismo é exclusivista; só existe uma forma de se nascer de novo, só uma maneira de ser justificado, somente um modo de ser reconciliado etc. Tudo o que posso dizer é que precisamos nos acostumar com a ideia, pois é esta a posição que assumimos por sermos cristãos -- toda a revelação cristã da verdade é exclusivista por natureza. Nós não pedimos desculpas pela verdade -- ela é o que é.

Ora, se acharmos que os cristãos que se reúnem para a adoração e o ministério em suas muitas divisões foram levados a fazerem isso pelo Espírito (como é o caso de Mateus 18:20), então o que estaríamos verdadeiramente dizendo é que o Espírito de Deus é o culpado pelas divisões que desonram a Cristo no testemunho cristão! Se o Espírito de Deus levou os vários grupos cristãos a se reunirem divididos uns dos outros, então Ele é o Autor de todas as divisões na cristandade! Nenhum cristão de sã consciência iria culpar o Espírito de Deus pelo triste e dividido estado do testemunho da igreja. Hamilton Smith escreveu: “Será que o Espírito Santo está reunindo a todos os grupos divididos e independentes que procuram se apossar da promessa de Mateus 18:20? Acreditar nisto implica necessariamente colocar no Espírito Santo a culpa pelas deploráveis divisões e independência que desonram a Cristo. Será que esses múltiplos centros encontrados na igreja professa são um resultado da obra do ‘Espírito de verdade’ que veio para glorificar a Cristo? Longe de nós tal pensamento!”.

Alguém poderia argumentar: “Mas você está ensinando que existe apenas um grupo certo de cristãos, e que todos os outros estão errados. Dá a impressão de que vocês são os únicos certos!”. Mas espere um minuto; eu não disse isto. O que estou dizendo é que as Escrituras ensinam que existe um terreno divino de reunião -- apenas uma posição eclesiástica neste mundo que o Senhor sanciona com a Sua presença. Eu não disse que aqueles com quem tenho comunhão estão neste terreno, embora eu acredite que o Espírito de Deus nos tenha guiado a este lugar. A verdade do congregar não diz respeito às pessoas, mas ao fato de o Senhor possuir um centro de reunião. Existe sempre o perigo de mudar o foco do Senhor no meio, para as pessoas que o Espírito de Deus reuniu ali, e acabar dizendo que aquelas pessoas possuem a mesa do Senhor. Isto é um erro; nosso foco deveria estar em Cristo no centro. Lembre-se, nossa reunião é “a Ele” (Hb 13:13).

O modo de Deus produzir unidade entre o Seu povo sempre foi no sentido de estabelecer um ponto ou centro de reunião ao qual o Seu povo pudesse se dirigir.

Nos tempos do Antigo Testamento o Senhor tinha um lugar onde Sua presença estaria, ao qual o Seu povo deveria se dirigir (Dt 12:5-7);

Nos tempos do Novo Testamento (cristãos) Ele estabeleceu um lugar onde Ele está no meio (Mt 18:20; 1 Co 5:4), onde o Espírito de Deus reúne os crentes;

Nos tempos do Milênio Ele também terá um lugar onde irá reunir os Seus santos daquele período (Sl 50:5; Ez 48:35).

Em cada dispensação o centro é sempre o próprio Senhor. A título de ilustração, suponha que exista uma gigantesca roda de bicicleta com raios, onde o Senhor estivesse no eixo da roda e cada crente estivesse sentado em um raio no ponto onde ele encontra o aro. Naquela posição os crentes estariam a certa distância uns dos outros e do Senhor. Mas se cada pessoa deslizasse pelo raio em direção ao eixo, quanto mais próxima estivesse do eixo, mais próximas as pessoas estariam umas das outras. Assim é no modo de Deus proceder; Ele produz unidade entre o Seu povo estabelecendo um ponto de reunião ao qual Ele reúne o Seu povo.

É
triste admitir, mas entre os santos reunidos pode ocorrer existirem alguns que tenham se manifestado com um espírito arrogante, dando a impressão de que “somos os únicos certos”. Isto só prova que é possível estar em uma posição correta (eclesiasticamente), mas em uma condição errada (espiritualmente). Como já foi mencionado, o orgulho da posição é uma das razões pelas quais o Senhor nos reduziu numericamente (Sf 3:10-11). Mas isto não altera o fato de que Deus tem um centro de reunião; apenas significa que alguns daqueles que estão neste centro podem estar em uma condição errada.

Deus gostaria que agíssemos conforme nossas convicções quando guiados pelo Senhor. “Cada um esteja inteiramente seguro em sua própria mente” (Rm 14:5). No que me diz respeito, creio que o Senhor está aqui no meio, mas não me gloriarei de estar reunido no centro de Deus, pois isto estaria totalmente fora de um espírito cristão. A graça e humildade genuínas não colocam as pessoas em evidência, como se fossem alguma coisa; aqueles que o Senhor tem reunido não são coisa alguma em si mesmos. Não se trata de presunção ou orgulho crer na verdade e agir baseado nela. O nome disto é fé.

AS DIVISÕES ENTRE AQUELES QUE MANTÊM A VERDADE DA REUNIÃO

O que dizer daqueles que têm estado no divino centro de reunião, porém se dividiram formando outra comunhão de reuniões? No que diz respeito às práticas, eles continuam se reunindo como fazemos. Estariam eles reunidos ao nome do Senhor e teriam Sua presença em seu meio no sentido coletivo do qual estamos falando aqui?

A resposta mais breve é não. Aqueles que saíram do centro de reunião em uma divisão não poderiam mais estar reunidos ao nome do Senhor. Mesmo que eles exteriormente e no modo de reunir pareçam ser a mesma coisa daqueles que estão no centro, isto não basta para se ter a sanção do Senhor. É possível congregar em conformidade com o padrão bíblico para os cristãos e ao mesmo tempo fazer isto de vontade própria. Do mesmo modo como acontece com uma igreja denominacional, uma divisão assim entre o povo de Deus não tem a aprovação do Senhor. Na verdade, aqueles que abandonam o centro divino de reunião e organizam uma divisão seriam mais responsáveis por seus atos do que os que estão nas denominações, pois tiveram um volume consideravelmente maior de luz. Os homens podem criar mais de uma expressão da verdade do único corpo estabelecendo uma mesa em divisão, mas o Espírito Santo não os guiaria a fazê-lo. Cristo não tem um só corpo na prática e muitos corpos em testemunho. O apóstolo Paulo perguntou: “Está Cristo dividido?”. O termo “Cristo” usado nas epístolas de Paulo denota a união de Cristo dos membros de Seu corpo. Paulo estava indicando aos Coríntios que tal união não pode ser dividida na prática, e tampouco deveria ser assim no testemunho -- que é o que estava acontecendo em Corinto.

Portanto, à luz do que as Escrituras ensinam, não cremos que o Espírito de Deus iria reunir cristãos em várias comunhões (ou federações de comunhões) sem que tais grupos estivessem em comunhão uns com os outros, mesmo que exteriormente parecessem iguais. Se o Espírito Santo fizesse assim estaria entrando em contradição com a própria Verdade na qual Ele quer que os cristãos estejam. W. Potter escreveu: “O Espírito de Deus não reúne em reuniões separadas; se Ele nos reunir, a consequência disto é que eu e você estaremos em comunhão um com o outro”.

Nas Conferências de Ottawa (Abril de 1987) foi apresentado o seguinte exemplo: “Se fôssemos voltar ao início -- ao dia de Pentecostes -- quando o Espírito de Deus desceu e uniu aquelas 120 pessoas em um corpo, e todas elas reunidas ao Nome do Senhor Jesus Cristo, suponha que Pedro tivesse um desentendimento com João e ambos decidissem formar duas comunhões separadas. Então haveria um grupo que seguiria Pedro e outro que seguiria João. Poderíamos dizer que o Espírito guiaria alguns a ir para um grupo e outros para ir ao outro? Ou que o Senhor estaria aprovando ambos? Não cremos que o Senhor aprovaria ambas as comunhões com Sua presença no meio deles, pois se assim fizesse Ele estaria na prática sendo condescendente com a divisão na igreja. Se fizesse assim Ele seria o Autor da confusão”. J. N. Darby escreveu: “Se existir uma assembleia local, e outra for estabelecida pela vontade do homem independente da primeira, somente a primeira será, aos olhos de Deus, moralmente a assembleia de Deus, e a outra não será, pois terá sido estabelecida em independência da unidade do corpo”.


Muitos grupos cristãos irão professar estarem congregados ao nome do Senhor. Alguns chegarão a colocar uma placa na frente de seus salões de reunião proclamando serem eles os santos que o Senhor reuniu. Mas será que isto significa que são? Potter escreveu: “As pessoas dizem: ‘Estamos reunidos ao nome do Senhor’. Então vamos ver se você realmente está. Como foi que você passou a congregar ao nome do Senhor?” Se você colocar à prova os grupos divididos entre os chamados irmãos reunidos ao nome do Senhor irá descobrir que existe uma razão para estarem divididos. Potter escreveu: “Se existirem dezenas de reuniões [em uma cidade], devemos procurar saber a origem delas”. E continua: “Qual é a origem de tal e tal reunião? Por que estão separadas das outras? Será bíblica a posição que ocupam?”.

Temos notado que cada grupo divergente que abandona os santos reunidos em uma divisão deixa de lado a verdade de que existe um divino centro de reunião; são obrigados a fazer isto a fim de justificarem sua posição divergente. Um exemplo foi quando Samuel Ridout (que saiu em uma divisão) foi questionado da razão de os irmãos com os quais ele estava terem apoiado Grant naquela divisão, e ele respondeu: “Em 1884 muitos de nós, antes da divisão, tínhamos um pensamento em comum de que NÓS tínhamos exclusivamente a Mesa, e por isso não deixávamos de estar em torno dela um dia sequer. Acredito que aquilo tinha a ver com a compulsão de partir o pão sem interrupção na Rua Craig, em Montreal”. Alguns meses mais tarde ele escreveu outra carta sobre o que acreditava ser e caracterizar a mesa do Senhor, dizendo que “nenhum grupo pode reivindicar ter sua posse exclusiva”. Aqui Ridout admite que eles costumavam professar a verdade de uma única mesa do Senhor, mas acabaram abrindo mão disso. Repare também que Ridout disse: “um pensamento em comum...”. Sim, a verdade de um único centro de reunião era aceita em comum entre os irmãos. O que ele está dizendo descaradamente é que os irmãos de um modo geral estavam perdidos a este respeito, e foi só depois que ele e seu partido saíram em uma divisão que puderam aprender a verdade!

Mais uma vez uma citação de uma publicação de 1914 de Grant, “The Gleaner” (“O Respigador”), diz: “Talvez o que pesa mais do nosso lado da balança, se é que podemos fazer tal comparação quando tratamos de coisas tão vitais e preciosas, é a verdade de que nenhum grupo de cristãos, e nem sequer nós mesmos, pode reivindicar um monopólio da mesa do Senhor, ou de estar reunido ao Nome do Senhor. Se esta verdade tivesse sido conhecida há trinta anos, talvez a divisão tivesse sido evitada”. Mais uma vez temos indivíduos que antes professavam a verdade de um único centro de reunião reconhecendo que a deixaram de lado. Após terem abandonado a verdade de um único centro de reunião eles consideram uma grande “verdade” o erro que adotaram.

Napoleon Noel, após ter saído em uma divisão, declara em seu livro “The History of the Brethren” (“A História dos Irmãos”), vol. 2, pág. 658, que “nenhum grupo de cristãos pode ter a posse exclusiva do próprio Senhor. Reivindicar tal coisa seria pura intolerância”. Muitas citações semelhantes poderiam ser acrescentadas aqui, mas estaríamos sendo redundantes.

Para deixarmos bem claro o que afirmamos é preciso perguntar: “Seria possível encontrar alguém dentre aqueles que saíram na divisão de Perth (1992) que afirme existir um centro divino de reunião na terra, e que a mesa do Senhor só poderia estar nesse único lugar?”. Deixando de lado a divisão Raven -- que envolve blasfêmia -- não acredito existir uma divisão entre os irmãos que afirme existir um centro divino de reunião. A questão é simples: não podem existir duas ou mais mesas do Senhor. Não podem existir duas ou mais comunhões de cristãos na terra com as quais o Senhor Se identifique como sendo o divino centro de reunião, mesmo que exteriormente possam congregar de maneira similar. Se Ele assim fizesse estaria sendo condescendente com a divisão na igreja.

Para aqueles que têm estado reunidos ao Seu Nome existe sempre o perigo de serem desviados deste terreno pelo inimigo, e quando isto acontece, tais pessoas se transformam nas mais ferozes oponentes da verdade da reunião. Antes de sua morte, J. N. Darby detectou entre os irmãos uma degradação geral da profissão desta verdade do único centro de reunião. Ele escreveu: “Grande parte do conflito coletivo é com a deliberada falta de compreensão da verdade de Cristo como o único centro de reunião. Ninguém é mais resolutamente contrário a esta verdade do que aquele que a conhece, porém não a pratica”.

A VERDADE DO ÚNICO LUGAR NÃO É UMA NOVA DOUTRINA

Todas as coisas que dizem respeito ao único centro de reunião não são ideias novas que tenham surgido recentemente (como alguns costumam insinuar). Decidi citar de propósito irmãos de outras gerações para demonstrar que não são novidades. O irmão Potter viveu nos séculos dezenove e vinte! O mesmo pode ser dito de Hamilton Smith. J. N. Darby viveu antes deles. São coisas que os irmãos reunidos ao nome do Senhor têm mantido e praticado por muitos anos.

Se não estivermos confortáveis com estes princípios sobre os quais os “santos reunidos” estão congregados, precisamos nos perguntar a razão de seguirmos com eles. Por favor, não me interprete mal, não estamos tentando expulsar ninguém, mas apenas estabelecendo o fato de que alguns são terrivelmente incoerentes quando assumem um lugar entre os santos reunidos e mesmo assim não creem na verdade da obra do Espírito em reunir ao único Centro, Cristo.

O CENTRO DE REUNIÃO DE DEUS NA TERRA NOS DIAS DE HOJE

Portanto, será que existe um centro de reunião para os cristãos na terra? Sim, as Escrituras ensinam que existe. Onde ele está? A tarefa de vocês é buscá-lo. A resposta para a pergunta “Quem possui a mesa do Senhor?” só pode ser “O Senhor”! A mesa é dele, e Ele está guiando a ela os crentes que têm este exercício. Deus quer que estejamos exercitados a respeito deste assunto e que procuremos saber a Sua vontade para sermos guiados por ela, assim como Pedro e João perguntaram ao Senhor “onde” era aquele lugar em sua época (Lucas 22:9). “A glória de Deus é encobrir as coisas, mas a glória dos reis é esquadrinhá-las” (Pv 25:2).

RESUMINDO: Se o Senhor possui um centro de reunião na terra, então Ele só poderia estar em um lugar -- em uma só posição eclesiástica. Se o Senhor estivesse no meio de todos os grupos cristãos, sancionando suas posições em sentido coletivo (Mt 18:20), então Ele seria o Autor das muitas tristes divisões existentes no testemunho público da igreja. Isto é algo que Ele não faria, pois seria negar a verdade de que só existe um centro de reunião: a própria Pessoa de Cristo.

Continua em: 
Capítulo Seis - Como pode ser o lugar certo com tantas coisas erradas?

Para retornar ao início da série, clique aqui: Sumário - AO SEU NOME

–– Bruce Anstey | AO SEU NOME
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Livro disponível em E-book (gratuito) ou impresso aqui:
https://aoseunome.blogspot.com/

–– Fonte 1: Página 
JP Padilha
–– Fonte 2: 
https://jppadilhabiblia.blogspot.com/

Capítulo Quatro - Por que não frequentar denominações?


PERGUNTA: Por que é tão errado alguns dentre os “santos reunidos” frequentarem as denominações de seus amigos cristãos? Afinal, eles também amam o Senhor!


Quem faz esta pergunta não compreende a posição que assumimos em separação da confusão eclesiástica existente na cristandade. Isto nos faz indagar por que, se pensam assim, estão entre os “santos reunidos”. Não me julgue mal, ficamos felizes e gratos por todos os que assumiram seu lugar à mesa do Senhor, mas realmente precisamos entender a razão de estarmos ali, e a pergunta deixa claro que alguns não entendem.

RESPOSTA: Existem diversas razões pelas quais não faz sentido que aqueles que estão congregados ao nome do Senhor frequentem cultos em uma igreja denominacional.

1) SERIA HIPOCRISIA APOIAR ALGO QUE SOMOS CONTRA

Antes de qualquer coisa, precisamos entender a posição que assumimos como congregados ao nome do Senhor “fora do arraial” (Hb 13:13). H. E. Hayhoe escreveu que “Trata-se de um protesto bíblico e prático contra a falta de fundamento bíblico da ordem denominacional na cristandade”, e há uma citação semelhante feita por W. Potter. Se uma pessoa se une àqueles que assumiram esta posição, há de se esperar que ela concorde com tal posição. A conclusão óbvia a respeito de alguém que tenha assumido esta posição, como separado da ordem sem fundamento bíblico que são as denominações, e volte a frequentar seus cultos é que tal pessoa é hipócrita. Paulo fala deste princípio em Gálatas 2:18, quando diz:

Porque, se torno a edificar aquilo que destruí, constituo-me a mim mesmo transgressor”. Como judeu convertido, ele havia assumido a posição cristã fora do judaísmo. Ele estava ativamente engajado em encorajar outros, que haviam assumido a mesma posição, a reterem “firmes a confissão da nossa esperança” (Hb 10:23). Para ele, retornar àquilo de onde sua consciência o havia tirado faria dele um “transgressor”. Enquanto Gálatas 2:18 faz referência ao judaísmo, o princípio é o mesmo com respeito à ordem denominacional na cristandade.

Participar de uma assim chamada “igreja” depois de termos assumido uma posição de protesto contra isso seria hipocrisia. William Kelly escreveu algo no sentido de que seria pecado ele retornar àquilo de onde sua consciência o havia tirado, e qualquer pessoa que insistisse para que ele fosse contra sua própria consciência estaria, na verdade, encorajando-o a pecar contra Deus.

2)
SERIA APROVAR A ORDEM DENOMINACIONAL QUE NÃO TEM BASE BÍBLICA

Em segundo lugar, ao frequentarmos uma denominação estaríamos assim tendo comunhão com ela, e portanto sancionando e aprovando as coisas feitas nesse lugar que está claramente fora da Palavra de Deus. Podemos ter certeza de que o Senhor não ficaria contente conosco se agíssemos assim.

Existe uma figura no Antigo Testamento que ilustra bem este ponto. Vamos ler a passagem em 1 Reis 13, pois acredito que podemos aprender algo dela.

E eis que, por ordem do SENHOR, veio, de Judá a Betel, um homem de Deus; e Jeroboão estava junto ao altar, para queimar incenso. E ele clamou contra o altar por ordem do SENHOR, e disse: Altar, altar! Assim diz o SENHOR: Eis que um filho nascerá à casa de Davi, cujo nome será Josias, o qual sacrificará sobre ti os sacerdotes dos altos que sobre ti queimam incenso, e ossos de homens se queimarão sobre ti. E deu, naquele mesmo dia, um sinal, dizendo: Este é o sinal de que o SENHOR falou: Eis que o altar se fenderá, e a cinza, que nele está, se derramará. Sucedeu, pois, que, ouvindo o rei a palavra do homem de Deus, que clamara contra o altar de Betel, Jeroboão estendeu a sua mão de sobre o altar, dizendo: Pegai-o! Mas a sua mão, que estendera contra ele, se secou, e não podia tornar a trazê-la a si. E o altar se fendeu, e a cinza se derramou do altar, segundo o sinal que o homem de Deus apontara por ordem do SENHOR. Então respondeu o rei, e disse ao homem de Deus: Suplica ao SENHOR teu Deus, e roga por mim, para que se me restitua a minha mão. Então o homem de Deus suplicou ao SENHOR, e a mão do rei se lhe restituiu, e ficou como dantes. E o rei disse ao homem de Deus: Vem comigo para casa, e conforta-te; e dar-te-ei um presente. Porém o homem de Deus disse ao rei: Ainda que me desses metade da tua casa, não iria contigo, nem comeria pão nem beberia água neste lugar. Porque assim me ordenou o SENHOR pela sua palavra, dizendo: Não comerás pão nem beberás água; e não voltarás pelo caminho por onde vieste. Assim foi por outro caminho; e não voltou pelo caminho, por onde viera a Betel. E morava em Betel um velho profeta; e vieram seus filhos, e contaram-lhe tudo o que o homem de Deus fizera aquele dia em Betel, e as palavras que dissera ao rei; e as contaram a seu pai. E disse-lhes seu pai: Por que caminho se foi? E seus filhos lhe mostraram o caminho por onde fora o homem de Deus que viera de Judá. Então disse a seus filhos: Albardai-me um jumento. E albardaram-lhe o jumento no qual ele montou. E foi após o homem de Deus, e achou-o assentado debaixo de um carvalho, e disse-lhe: És tu o homem de Deus que vieste de Judá? E ele disse: Sou. Então lhe disse: Vem comigo à casa, e come pão. Porém ele disse: Não posso voltar contigo, nem entrarei contigo; nem tampouco comerei pão, nem beberei contigo água neste lugar. Porque me foi mandado pela palavra do SENHOR: Ali não comerás pão, nem beberás água; nem voltarás pelo caminho por onde vieste. E ele lhe disse: Também eu sou profeta como tu, e um anjo me falou por ordem do SENHOR, dizendo: Faze-o voltar contigo à tua casa, para que coma pão e beba água (porém mentiu-lhe). Assim voltou com ele, e comeu pão em sua casa e bebeu água. E sucedeu que, estando eles à mesa, a palavra do SENHOR veio ao profeta que o tinha feito voltar. E clamou ao homem de Deus, que viera de Judá, dizendo: Assim diz o SENHOR: Porquanto foste rebelde à ordem do SENHOR, e não guardaste o mandamento que o SENHOR teu Deus te mandara, Antes voltaste, e comeste pão e bebeste água no lugar de que o SENHOR te dissera: Não comerás pão nem beberás água; o teu cadáver não entrará no sepulcro de teus pais” (1 Rs 13:1-22).

Bem, o restante da história todos nós já conhecemos: um leão o encontrou no caminho e o matou. Que triste final para sua vida! Existem algumas lições valiosas que podemos aprender disto. No capítulo 12, Jeroboão havia estabelecido dois altares rivais ao altar do Senhor em Jerusalém.

Eles negavam a unidade de Deus por existirem dois bezerros para representarem o único Deus de Israel. “Ouve, Israel, o SENHOR nosso Deus é o único SENHOR” (Dt 6:4).

Eles negavam a verdade do único centro de reunião para ofertas e sacrifícios, ao fazerem de Betel e Dã lugares alternativos de adoração. “Então haverá um lugar que escolherá o SENHOR vosso Deus” (Dt 12:11).

Eles dividiam o povo de Deus, o qual Deus queria que estivesse unido como um só povo. “...e elas se farão uma só na minha mão” -- este era o desejo original de Deus (Ez 37:15-19).

Como resposta Deus levantou um testemunho contra aqueles falsos centros de adoração e sacrifício. “Um homem de Deus” foi enviado de Judá (onde estava o centro de Deus) para protestar contra a falsa posição estabelecida por Jeroboão em Betel. Ele foi “por ordem do Senhor”, o que demonstra que o testemunho contra a falta de fundamento nas Escrituras para aqueles falsos altares vinha de Deus. De um modo similar, a posição de separação de tudo o que não é bíblico -- que é a que os santos reunidos ao nome do Senhor assumem na cristandade -- é na realidade um protesto bíblico vindo de Deus.

É
significativo que o homem de Deus “clamou” contra o altar, mas “suplicou” pelo rei e pelo povo que oferecia seus sacrifícios ali (vers. 2, 6). Do mesmo modo, este protesto bíblico dos santos reunidos ao nome do Senhor não é contra os queridos crentes que adoram em suas igrejas denominacionais, mas sim contra o sistema no qual estão envolvidos. Não criticamos nossos queridos irmãos que estão nas igrejas denominacionais; nós os amamos e oramos pelo bem deles e para que sejam abençoados. O fato de o rei ter estendido sua mão contra o profeta demonstra que existem reprovação e perseguição conectadas à posição de separação que assumimos, e precisamos estar preparados para isso. “Saiamos, pois, a ele fora do arraial, levando o seu vitupério [opróbrio ou vergonha]” (Hb 13:13).

Depois que a mão do rei foi restaurada, aqueles que estavam em Betel fizeram uma dupla tentativa de envolver o homem de Deus em uma falsa associação com eles naquele lugar. Houve a oferta de um presente da parte do rei para que ele ganhasse alguma vantagem neste mundo, e também um convite para que fosse até a casa do rei para se recompor da viagem. Tratava-se de uma evidente tentativa de desviar o servo de Deus do caminho de obediência à Palavra de Deus. A tentativa foi frustrada pela obediência do homem de Deus àquilo que lhe havia sido dito “pela palavra do Senhor” (vers. 7-10). Isto nos ensina que, quando somos provados, devemos nos agarrar aos princípios que nos foram ensinados pela Palavra de Deus e nos deixarmos guiar por eles.

Tendo fracassado em sua primeira tentativa, o inimigo atacou o homem de Deus de uma maneira muito mais sutil. O “velho profeta em Betel” aproximou-se do homem de Deus e disse a ele uma grande mentira para tentar fazê-lo voltar e ter comunhão consigo naquela falsa posição. Para convencer o profeta mais jovem, o velho profeta usou daquilo que alegou ser “a palavra do Senhor”. É triste ter de admitir, mas seu estratagema funcionou e o homem de Deus foi enganado para que retornasse a Betel para comer pão com ele (vers. 11;32). Isto nos ensina que devemos permanecer em guarda contra nossos conservos que distorcem a Palavra de Deus para nos persuadir a trilhar o caminho errado. Muitos cristãos sinceros têm sido persuadidos por seus irmãos a agirem sobre algum falso princípio no que diz respeito à comunhão, e assim acabaram sendo desviados da mesa do Senhor para alguma falsa posição. Fiquemos alerta contra isso.

Você irá reparar que o velho profeta de Betel se esforçou bastante para comprometer o homem de Deus e convencê-lo a ter comunhão consigo em sua falsa posição. Ele queria desesperadamente fazê-lo comer e beber naquele lugar, o que expressa comunhão. Evidentemente o velho profeta tinha consciência de estar em uma posição sem fundamento nas Escrituras e queria que outros estivessem ali com ele para aliviar o fardo em sua consciência.


O homem de Deus fracassou por não partir do “lugar” contra o qual ele havia sido enviado para testificar (vers. 16). Ele caminhou uma pequena distância e então se sentou sob uma árvore, mas ainda estava em Betel. Talvez o velho profeta não o alcançasse se ele tivesse continuado caminhando. Sua demora em sair dali permitiu sua queda. Fica muito claro desta passagem o que Deus pensa daqueles que estão em Seu divino centro e mantêm comunhão com os que estão em uma falsa posição eclesiástica. Creio que isto responda à pergunta se os “santos congregados” deveriam frequentar uma igreja denominacional.

Resumindo, ocorreram três coisas como consequência de o homem de Deus ter voltado para comer e beber com o velho profeta de Betel. Ao fazer isso ele:

Colocou sua aprovação naquele lugar de sacrifício que não tinha a aprovação do Senhor.

Colocou sua aprovação na infidelidade do velho profeta que ocupava aquela falsa posição.

Anulou seu próprio testemunho contra a falta de fundamento do falso centro, e assim encerrou sua história de testemunho do único lugar escolhido por Deus.

3)
PERDERÍAMOS NOSSO PODER COMO TESTEMUNHAS DA VERDADE DA ASSEMBLEIA

Uma terceira razão de precisarmos andar em separação das igrejas denominacionais é que se nos juntarmos a elas perderemos nosso poder como testemunhas da verdade da assembleia. No caso do profeta que voltou a Betel para comer pão com o velho profeta, quando desobedeceu a Palavra do Senhor e comeu naquele lugar, um leão o matou e aquele foi o fim de sua história como uma testemunha para o Senhor.

O Senhor disse a Jeremias: “Se tu voltares, então te trarei, e estarás diante de mim; e se apartares o precioso do vil, serás como a minha boca; tornem-se eles para ti, mas não voltes tu para eles” (Jr 15:19). O ponto que veremos aqui é que, se Jeremias permanecesse separado da corrupção que havia em Judá, ele continuaria a ser usado como a “boca” do Senhor. Se ele voltasse e se juntasse ao povo, perderia seu poder como um testemunho. Do mesmo modo, se permanecermos na posição eclesiástica em que estamos por termos nos separado, poderemos e seremos usados para levar um testemunho da verdade em meio à confusão e, em certo sentido, sermos a “boca” do Senhor. Seremos um “vaso para honra, santificado e idôneo para uso do Senhor, e preparado para toda a boa obra” (2 Tm 2:21). Aqueles que permanecem na confusão dos sistemas denominacionais podem ser usados pelo Senhor para algumas obras, mas não para “toda a boa obra”. Eles não podem ser usados para ensinar a verdade da assembleia e a ordem adequada a ela -- ao menos com poder, já que tal verdade condena a posição em que se encontram. E se nós retornarmos àquilo de que nos separamos, perderemos nosso poder de testemunhar.

4)
ESTARÍAMOS ASSOCIANDO A MESA DO SENHOR COM A ORDEM SEM BASE BÍBLICA EXISTENTE NAS DENOMINAÇÕES

Uma quarta razão pela qual aqueles congregados ao nome do Senhor devem ser cuidadosos quanto a terem comunhão com as denominações é que, ao frequentarmos seus cultos, iremos associar a mesa do Senhor com a ordem existente nelas, para a qual não há base bíblica. O apóstolo Paulo fala deste princípio em 1 Coríntios 10:14-22. Ele demonstra que, seja no cristianismo, judaísmo ou paganismo, existe uma identificação. Em cada caso, a participação em uma determinada ordem religiosa é a expressão da comunhão de alguém com o que existe ali.

Com respeito ao cristianismo, Paulo disse: “Porventura o cálice de bênção, que abençoamos, não é a comunhão do sangue de Cristo? O pão que partimos não é porventura a comunhão do corpo de Cristo?” (1 Co 10:16). O ato de partirmos o pão (participando da ceia do Senhor) é a expressão de nossa comunhão com aqueles com quem partimos o pão. O mesmo princípio vale no que diz respeito a Israel. Ele disse: “Vede a Israel segundo a carne; os que comem os sacrifícios não são porventura participantes do altar?” (1 Co 10:18). Alguém que participasse dos sacrifícios feitos no altar do judaísmo estaria identificado com tudo que aquele altar representava. Paulo mostrou também que o mesmo princípio vale para a idolatria e o paganismo. Ele disse: “Antes digo que as coisas que os gentios sacrificam, as sacrificam aos demônios, e não a Deus. E não quero que sejais participantes com os demônios.” (1 Co 10:20). Neste caso aqueles que participassem do “cálice dos demônios” estariam em comunhão com os demônios por detrás dos ídolos.

O ponto levantado por Paulo aqui é muito claro: nosso ato de participar em uma comunhão religiosa qualquer -- judaica, pagã ou cristã -- nos identifica com tudo o que acontece ali. O princípio se aplica às mesas dos homens existentes na ordem de igrejas denominacionais. Se participarmos com eles, e eles ensinarem má doutrina, estaremos em comunhão com essa má doutrina. Se eles estiverem engajados em práticas de adoração incorretas segundo as Escrituras, e participarmos com eles, estaremos também em comunhão com essas práticas. Eu sei que isto é terrivelmente impopular, mas permanece o fato de que quando nos associamos com qualquer ordem sem base bíblica no sistema religioso denominacional -- quer concordemos com suas práticas ou não -- mesmo assim estaremos identificados com elas. E o que é mais importante, se partirmos o pão à mesa do Senhor, o nosso ato de termos comunhão com uma ordem sem fundamento bíblico na cristandade faz com que estejamos associando isso à mesa do Senhor. Certamente isto não pode ser do agrado do Senhor.


5)
EXISTE O PERIGO DE ACABAR SENDO LEVADO PARA DENTRO DAS IGREJAS DENOMINACIONAIS

Uma quinta razão pela qual precisamos ser cuidadosos em nossas associações com as igrejas denominacionais é que existe o perigo de nos deixarmos levar por elas. Existe uma possibilidade real de adquirirmos má doutrina -- especialmente opiniões eclesiásticas. O princípio que eu aplicaria neste caso é “Porque nenhum de nós vive para si, e nenhum morre para si” (Rm 14:7). Ele mostra que somos afetados pelo meio. As ideias errôneas daqueles com quem nos associamos nesses grupos eclesiásticos acabarão sendo passadas para nós. Pode levar algum tempo, mas é um fato. “Não vos enganeis: as más conversações corrompem os bons costumes” (1 Co 15:33). Em Ageu 2:10-14 lemos: “Ao vigésimo quarto dia do mês nono, no segundo ano de Dario, veio a palavra do SE-NHOR por intermédio do profeta Ageu, dizendo: Assim diz o SENHOR dos Exércitos: Pergunta agora aos sacerdotes, acerca da lei, dizendo: Se alguém leva carne santa na orla das suas vestes, e com ela tocar no pão, ou no guisado, ou no vinho, ou no azeite, ou em outro qualquer mantimento, porventura ficará isto santificado? E os sacerdotes responderam: Não. E disse Ageu: Se alguém que for contaminado pelo contato com o corpo morto, tocar nalguma destas coisas, ficará ela imunda? E os sacerdotes responderam, dizendo: Ficará imunda. Então respondeu Ageu, dizendo: Assim é este povo, e assim é esta nação diante de mim, diz o SENHOR; e assim é toda a obra das suas mãos; e tudo o que ali oferecem imundo é” (Ag 2:10-14). Talvez você discorde e argumente: “Mas esses cristãos não são maus!” No que diz respeito à vida pessoal deles isto pode ser verdade, mas é de suas opiniões errôneas acerca do que é a igreja que estamos falando aqui, ou seja, apenas dos princípios aos quais eles estão conectados. Nas Escrituras há muitos exemplos que demonstram que precisamos tomar cuidado com as pessoas com quem nos associamos.

Talvez alguém possa estar perguntando: “Existe algum problema em as irmãs congregadas ao nome do Senhor participarem de estudos da Bíblia para mulheres promovidos por essas organizações?” Entendo que a pergunta se refira a reuniões que não sejam feitas dentro do prédio de uma igreja, portanto você estaria dizendo que participar de reuniões assim não seria o mesmo que frequentar as igrejas denominacionais. Não há nada de errado em irmãs se reunirem para ler a Palavra, e devemos encorajá-las neste sentido. Mas eu creio que não exista fundamento bíblico para estudos entre mulheres voltados ao ensino. Em 1 Coríntios 14:35 lemos que “se querem aprender alguma coisa, interroguem em casa a seus próprios maridos”. Nas Escrituras você não encontra uma organização para-eclesiástica criada para ensinar mulheres. Talvez seja difícil aceitar tal ideia, pois nesses grupos as pessoas estariam fazendo algo bom e correto -- afinal, que mal pode existir em se estudar as Escrituras?

Todavia, é possível fazer a coisa certa do jeito errado, e é isto que estou tentando mostrar aqui. Este versículo que acabo de citar eu tirei das Escrituras, e lembrem-se de que no início eu disse que procuraria responder às dúvidas com as Escrituras. O que eu disse pode não ser muito popular, mas está nas Escrituras.

A réplica usual neste caso é: “Mas e se uma irmã não tem marido?”. A palavra traduzida como “maridos” nesta passagem tem um significado mais amplo do que apenas homens casados; ela se refere a homens de uma maneira geral. A mesma palavra grega é traduzida como “homens” várias vezes no Novo Testamento (Atos 1:16, 29, 37; 3:2; 7:2; 9:2; 13:15; 15:7 etc.). Creio que era assim que ela deveria ter sido traduzida neste versículo. O ponto que Paulo está querendo frisar é que as irmãs podem perguntar aos homens (irmãos) em casa, isto é, no ambiente doméstico, se quiserem entender alguma coisa que foi falada na assembleia. Volto a repetir que entendo que isto seja o mesmo que jogar um balde de água fria naquilo que alguns gostariam de ouvir, mas é isto que as Escrituras dizem, e não somos mais sábios que a Palavra de Deus.

O foco de nosso assunto, que é o perigo de sermos afetados por nossas associações, é bem real. Como já foi mencionado, existe a possibilidade de nos deixarmos levar pelas ideias das igrejas denominacionais através da comunhão com cristãos conectados a esses sistemas. Alguém me contou que em uma assembleia congregada ao nome do Senhor havia sete irmãs que passaram a participar de um estudo bíblico para mulheres organizado por pessoas de uma igreja denominacional, e poucos anos depois apenas duas delas continuavam congregadas. Portanto não devemos achar que esse tipo de comunhão não cause um efeito nas pessoas. Uma das consequências de alimentar-se do ministério que tem suas raízes no arraial é ser arrastado para o arraial. E no arraial você não encontrará um ministério que leve a pessoa para “fora do arraial” -- para o lugar correto designado para o cristão (Hb 13:13). Eu odiaria ver um grupo de jovens ser levado por algo assim. Não seria a primeira vez que isto aconteceria.


Anos atrás, quando eu era jovem e faminto por aprender a verdade, tínhamos em nossa assembleia uma situação ideal. Havia muitos mestres bem dotados ali -- os irmãos Clark, Coleman, e também, dentre aqueles menos atuantes, tínhamos meu pai, meus tios Stan e Jim, e o irmão Keating. Todos tinham boas bibliotecas de sã doutrina e nos ensinavam uma boa parcela da verdade nas reuniões semanais, pelo que sou muito grato. Quando íamos a uma reunião de leitura, nós nos sentávamos ali tomando notas e bebendo tudo aquilo. Muito do que hoje sei eu aprendi com aqueles homens.

De qualquer modo, em meio a tudo isso havia uma irmã na assembleia que costumava frequentar regularmente um estudo bíblico para mulheres organizado por uma denominação da cidade. Quando alguém lhe perguntava a razão de frequentar aquele grupo de estudo ela respondia que não estava recebendo alimento nas reuniões! O que?! Como assim? Lá estávamos nós anotando em um ritmo febril a maravilhosa verdade que saía da boca daqueles homens e ela dizendo que não estava sendo alimentada?! Nem preciso dizer que aquela irmã não está mais congregada ao nome do Senhor; hoje ela frequenta uma igreja denominacional.

Que triste estado este em que nos encontramos! Antigamente, há uns 150 anos, essas igrejas denominacionais costumavam procurar os irmãos congregados ao nome do Senhor para aprenderem a verdade; agora nós precisamos ir a eles para sermos alimentados! Isto me faz lembrar os filhos de Israel, que desciam aos filisteus para terem seus implementos agrícolas afiados por eles (1 Sm 13:19-22). Não estou querendo dizer que nossos irmãos nas igrejas denominacionais sejam como os ímpios filisteus; estou apenas triste pelo fato dos santos congregados acharem que precisam ir a esses em busca da verdade quando deveria ser o contrário.

Talvez o problema tenha duas faces. Isto poderia apenas ser um sintoma de um espírito inquieto e insatisfeito em busca de algo diferente. Mas, por outro lado, precisamos perguntar a nós mesmos por que alguém em nossa assembleia local iria querer participar de um estudo bíblico em uma denominação. Por que uma irmã acharia que não está sendo alimentada nas reuniões da assembleia? Talvez fosse um problema com a condição dela, mas poderia ser também por não estarmos dando aos santos o alimento necessário. Precisamos pensar nisto. Creio que parte do problema é culpa daqueles que têm a responsabilidade de ensinar na assembleia. Será que estamos alimentando como deveríamos? Será que estamos ensinando a verdade aos santos? Quando nos reunimos, será que ficamos procurando algo para dizer apenas para preencher aquela hora, ou estamos trazendo algo realmente significativo? Não estou tentando apontar culpados entre os que ensinam; o que desejo é ser exercitado neste sentido. Mas se não tivermos empregado algum tempo aprendendo a verdade para nós mesmos, ela não sairá como em um passe de mágica quando estivermos nas reuniões de estudo; precisamos ser diligentes durante a semana em nossos estudos pessoais para termos certeza de podermos trazer algo para as reuniões no sentido de alimento para as almas. Então, talvez as pessoas fiquem contentes por estarem nas reuniões da assembleia e deixem de procurar por algo em outros lugares.


RESUMINDO: Alguém que esteja congregado ao nome do Senhor -- em separação da ordem sem base bíblica das igrejas denominacionais -- e que frequente um culto denominacional estará sendo inconsistente com a posição que assumiu, pois:

1)
Estará sendo hipócrita ao apoiar algo contra o que protestamos.

2)
Estará sancionando algo que está claramente em desacordo com a Palavra de Deus.

3)
Perderá poder como testemunha da verdade da assembleia.

4)
Estará conectando a mesa do Senhor com uma ordem sem fundamento bíblico que é a das denominações.

5)
Estará se colocando em uma posição em que poderá receber má doutrina e ser afastado da mesa do Senhor.

Continua em: 
Capítulo Cinco - Como podemos dizer que só existe um centro de reunião?

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–– Bruce Anstey | AO SEU NOME
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–– Fonte 1: Página JP Padilha
–– Fonte 2: https://jppadilhabiblia.blogspot.com/

QUEM É O JP PADILHA? QUAL É A SUA PROFISSÃO?

Se você me perguntar o que eu sou, eu lhe responderei: "sou esposo". Se você insistir, lhe responderei: "sou pai"....