CAPÍTULO 6: E QUANTO A APOCALIPSE 20? | Matthew Waymeyer


Vários anos atrás, uns amigos meus alugaram um filme de aventura para assistir com suas duas filhas. Durante uma cena intensa no início do filme, as meninas ficaram com medo e já não tinham certeza se queriam terminar o DVD. Então, seus pais fizeram algo criativo – eles avançaram até o final e mostraram a suas filhas que os personagens principais estavam vivos e bem na última cena. Então, eles voltaram o filme e continuaram de onde haviam parado. Agora as meninas podiam seguir pelas partes assustadoras do filme porque sabiam ao certo como tudo ficaria bem no final.

Isso é precisamente o que Deus faz no livro de Apocalipse. A fim de fortalecer e encorajar a igreja perseguida, Ele revela uma série de visões em que Ele avança até o fim dos tempos e mostra o Seu povo que, quando tudo for dito e feito, o Senhor Jesus Cristo é Vitorioso sobre tudo o que é mau. E saber disso – saber o fim desde o começo – é parte do que capacita a igreja a permanecer firme e perseverar em tempos de sofrimento. No final, Jesus vence!

Em uma dessas visões – encontrada em Apocalipse 20.1-6 – o Senhor mostra ao apóstolo João aquilo que é comumente conhecido como o reino milenar de Cristo.[1] Nesta passagem monumental, João descreve um período de tempo de mil anos, durante o qual Satanás estará preso no abismo (20.1-3), e o Senhor Jesus Cristo reinará sobre a terra (20.4-6). Esta visão tornou-se um ponto focal no debate entre as várias posições milenaristas, sendo rotulada por um importante Amilenista como a passagem bíblica mais importante sobre o assunto do milênio.[2]

Uma distinção fundamental na discussão diz respeito ao momento do reinado de mil anos de Cristo. De acordo com o Premilenismo Futurista, as visões em Apocalipse 19-22 ocorrerão na mesma ordem em que estão escritas, e, portanto, o reino milenar de Apocalipse 20 é ainda futuro. Após o período de sete anos da tribulação (Ap 6-19), Jesus voltará em glória (19.11-16), trazendo julgamento para o falso profeta, a besta e os exércitos incrédulos da terra (19.17-21). Satanás será preso no abismo por mil anos (20.1-3) e Jesus estabelecerá Seu Reino na terra onde Ele reinará com os santos em perfeita justiça (20.4-6). Ao final dos mil anos, Satanás será solto e derrotado de uma vez por todas (20.7-10); os ímpios serão ressuscitados, julgados e lançados no lago de fogo (20.11-15); então, o estado eterno do novo céu e nova terra começará (21-22). Esta é a perspectiva Premilenista Futurista de Apocalipse 20.

Em contraste, o Amilenismo e o Posmilenismo afirmam que o reinado de mil anos de Cristo ocorre durante a presente era que se estende desde o momento da Sua primeira vinda até o tempo da segunda vinda. Mais especificamente, eles acreditam que, embora o retorno de Cristo seja descrito no final do capítulo 19, Apocalipse 20.1 traz o leitor de volta para o início da era atual, de modo que o reino milenar é uma realidade presente. Em relação ao momento, então, a principal diferença é que Amilenismo e Posmilenismo afirmam que o período de mil anos de Apocalipse 20 é presente, enquanto o Premilenismo Futurista sustenta que é futuro.[3]

Este capítulo examinará vários aspectos-chave em Apocalipse 20 para demonstrar que esta passagem ensina claramente que o reinado de mil anos de Cristo ocorrerá depois da Sua segunda vinda, conforme sustentado pelo Premilenismo Futurista. De importância central a esta afirmação são: (1) o momento do aprisionamento de Satanás, (2) a natureza da primeira ressurreição, (3) a duração dos mil anos e (4) a cronologia das visões de João.


O MOMENTO DO APRISIONAMENTO DE SATANÁS
Em Apocalipse 20.1-3, a visão de João focaliza sobre o status de Satanás durante o reinado milenar de Cristo. O apóstolo escreve:

“E vi descer do céu um anjo, que tinha a chave do abismo, e uma grande cadeia na sua mão. Ele prendeu o dragão, a antiga serpente, que é o Diabo e Satanás, e amarrou-o por mil anos. E lançou-o no abismo, e ali o encerrou, e pôs selo sobre ele, para que não mais engane as nações, até que os mil anos se acabem. E depois importa que seja solto por um pouco de tempo.” (
Apocalipse 20:1-3)

Uma questão primordial envolve o momento do aprisionamento de Satanás. De forma simples, seria agora ou no futuro? Em outras palavras, será que Satanás está atualmente preso no abismo durante a era atual, ou será que seu aprisionamento de mil anos se dará após a segunda vinda de Cristo? Amilenismo e Posmilenismo vêem a prisão de Satanás como uma realidade presente – o milênio é agora, segundo eles – enquanto o Premilenismo Futurista a vê como futuro.

O confinamento de Satanás não pode ser considerado uma realidade presente, pois os eventos de Apocalipse 20.1-3 são incompatíveis com a descrição do Novo Testamento de sua constante influência durante a era atual. De acordo com a visão de João, Satanás será cortado inteiramente de toda a atividade terrena durante os mil anos. A imagem dele sendo lançado no abismo e tendo-o fechado e selado sobre ele fornece uma ilustração vívida de uma remoção total de sua influência sobre a Terra. De fato, se uma visão tem a intenção de ensinar que Satanás ficará completamente inativo durante os mil anos descritos [com riqueza de detalhes] em Apocalipse 20, fica difícil [e ilógico] imaginar como isso poderia ser retratado de forma mais clara.

A localização específica da prisão de Satanás torna isso especialmente claro. A palavra Abismo se refere a uma prisão para os espíritos malignos. Quando os espíritos malignos são confinados no abismo, a Bíblia indica que eles são impedidos de vagar livremente pela terra. Isto é evidente em Lucas 8, onde Jesus deparou-se com um homem possuído por [vários] demônios. Quando Jesus passou por este homem, os demônios que o habitavam suplicaram que não fossem mandados para o abismo, mas que os permitisse entrar em uma manada de porcos próxima ao local (8.31-32). A razão para o pedido dos demônios não era porque eles estavam meramente determinados a matar os porcos, mas porque a prisão no abismo os teria cortado de ter qualquer influência neste mundo – pelo menos enquanto eles estivessem no abismo – enquanto que uma saída e refúgio na manada de porcos lhes permitiriam continuar a vaguear livremente pelo mundo e a causar estragos na terra.

NOTA: “E eis que clamaram, dizendo: Que temos nós contigo, Jesus, Filho de Deus? Vieste aqui atormentar-nos antes do tempo?” (Mateus 8:29). “Antes do tempo” foi a expressão usada pelos demônios para se referirem à segunda vinda propriamente dita de Jesus Cristo para o Seu Reinado, quando os espíritos malignos estarão presos no abismo e impedidos de atuarem no mundo. (JP Padilha)

O mesmo pode ser visto no livro de Apocalipse. Em Apocalipse 9.1-3, uma multidão de demônios deve, primeiramente, ser liberada do abismo antes de causar danos na Terra. Antes dessa liberação, no entanto, os demônios não têm nenhuma influência terrena, qualquer que seja. Da mesma forma, em Apocalipse 20, Satanás deverá primeiro ser “solto da sua prisão” (20.7) para que possa “sair a seduzir as nações” (20.8). Mas enquanto ele estiver confinado no abismo, o diabo não é capaz de sair de sua prisão e, portanto, sua atividade na terra é completamente nula.

Em contraste com isto, o Novo Testamento deixa bem claro que Satanás – que é descrito como “o deus deste século” (2Co 4.4) e “o príncipe deste mundo” (Jo 12.31; 14.30; 16.11; cf. 1Jo 4.4) – é extremamente ativo na terra durante a era atual. Ele não somente “anda em derredor, como leão que ruge, buscando a quem possa devorar” (1Pe 5.8), mas também está envolvido em uma série de outras atividades: ele conta mentiras (Jo 8.44); ele tenta crentes a pecar (1Co 7.5; Ef 4.27); ele se disfarça como um anjo de luz (2Co 11.13-15); ele procura enganar os filhos de Deus ( 2Co 11.3); ele arrebata o evangelho dos corações incrédulos (Mt 13.19; Mc 4.15; Lc 8.12; cf 1Ts 3.5); ele leva “vantagens” sobre crentes (2Co 2.11); ele influencia as pessoas a mentir (At 5.3); ele mantém os incrédulos sob seu poder (At 26.18; Ef 2.2; 1Jo 5.19); ele “esbofeteia” os servos de Deus (2Co 12.7); ele impede o progresso do ministério (1Ts 2.18); ele procura destruir a fé dos crentes (Lc 22.31); ele promove guerra contra a igreja (Ef 6.11-17); ele ilude e engana as pessoas, mantendo-as cativas para fazerem sua vontade (2Tm 2.26). É impossível conciliar esta vasta descrição bíblica das atividades atuais de Satanás com a visão de que ele esteja atualmente selado no abismo.

Amilenistas e Posmilenistas têm respondido a esta incongruência insistindo que a prisão de Satanás só o impede de enganar as nações, porém, deixando-o livre para se envolver nestas outras atividades. Afinal – dizem eles – esse é o único propósito declarado do aprisionamento de Satanás em Apocalipse 20.3: “... para que não mais enganasse as nações”. Desta forma, Amilenistas e Posmilenistas dizem que a atividade de Satanás na era atual é limitada, mas não eliminada.

O problema deste argumento é que ele focaliza no propósito declarado no versículo 3 enquanto ignora a localização real do aprisionamento de Satanás. Se o diretor de uma prisão coloca um prisioneiro em confinamento solitário com o propósito declarado de impedi-lo de matar outros presos, isso não significa que ele está livre para roubá-los e fazer outras atividades. Afinal de contas, a localização do confinamento solitário o remove completamente do resto da prisão e o separa inteiramente dos outros prisioneiros. Da mesma forma, o grau de restrição de Satanás em Apocalipse 20 é determinado não somente pelo propósito declarado, mas também pela localização de sua prisão – o abismo – que o remove da terra e o corta de qualquer influência lá.[4]

Adicionalmente, o Novo Testamento ensina que Satanás está envolvido em enganar as nações durante a era atual. De acordo com 2Coríntios 4.4, Satanás “cegou o entendimento dos incrédulos para que não lhes resplandeça a luz do evangelho da glória de Cristo”. Em outras palavras, Satanás está atualmente enganando os incrédulos que compõem as nações deste mundo, cegando-os e impedindo-os de abraçar o evangelho. Além disso, o livro do Apocalipse ensina que Satanás e seus demônios continuarão a enganar as nações até o momento em que Jesus retorna para estabelecer Seu reino, e, só então, Satanás será lançado no abismo (Ap 12.9; 13.14; 18.23; 19.20). Se Satanás está impedido de enganar as nações durante o reinado milenar de Cristo e ainda assim está enganando as nações na era atual, os mil anos de Apocalipse 20 não podem estar ocorrendo agora. O aprisionamento de Satanás tem de ser futuro.[5]


A NATUREZA DA PRIMEIRA RESSURREIÇÃO
Em Apocalipse 20.4-6, o apóstolo João se refere a pessoas que “viveram e reinaram com Cristo durante mil anos” (20.4), descrevendo este vir à vida como “a primeira ressurreição” (20.5).[6] De acordo com o Premilenismo Futurista, esta é a primeira de duas ressurreições físicas em Apocalipse 20, ressurreições que são separadas por mil anos. A primeira é uma ressurreição dos justos – os crentes fiéis que são martirizados durante a tribulação (20.4) – e a segunda ressurreição é dos ímpios que estarão diante do trono do Juízo Final, após o reino milenar (20.11-15), conforme João escreve: “viveram e reinaram com Cristo durante mil anos. Os restantes dos mortos não reviveram até que se completassem os mil anos” (20.4-5).

Amilenistas e Posmilenistas rejeitam as descrições sobre as duas ressurreições físicas separadas por mil anos, insistindo que “a primeira ressurreição” no início dos mil anos não é física, mas espiritual. Eles explicam a natureza espiritual desta ressurreição de várias maneiras, mas a visão mais comum deles é que a primeira ressurreição se refere à regeneração dos crentes no momento da conversão. Desta forma, a primeira ressurreição ocorre durante a era presente quando aqueles que estão espiritualmente mortos são vivificados em Cristo (Jo 5.25; Ef 2.4-6; Cl 2.12-13; 1Jo 3.14) e vivem para reinar com Ele no presente reino milenar.

Porém, há várias dificuldades com este ponto de vista. Primeiro, a palavra traduzida como “ressurreição” (anastasis) é usada outras quarenta e uma vezes no Novo Testamento e nunca se refere à regeneração. Essa objeção não é conclusiva porque é teoricamente possível que João esteja usando esta palavra de uma maneira única – mas isto coloca o ônus da prova sobre aqueles que dizem que ela é usada dessa maneira em Apocalipse 20.

Um segundo problema diz respeito ao reviver dos “restantes dos mortos” no início do versículo 5. Quando João diz que essas pessoas “reviveram” (ezêsan), os intérpretes concordam que esta palavra se refere a uma ressurreição física. Todavia, pelo fato de João usar a mesma forma da mesma palavra grega (ezêsan) para se referir ao “vir à vida” dos indivíduos no versículo 4, segue-se logicamente que essa “primeira ressurreição” é uma ressurreição física também. Caso contrário, “somos confrontados com o problema de uma mesma palavra estar sendo usada no mesmo contexto com dois significados completamente distintos, porém sem qualquer indicação quanto à mudança de significado”.[7] O Premilenismo Futurista não tem esse problema, pois ele vê o verbo ezêsan
como se referindo a uma ressurreição física nos dois versículos – uma ressurreição dos justos no versículo 4 e uma ressurreição dos ímpios no versículo 5. [Pois esta é a intenção clara do autor inspirado].

Em terceiro lugar, esta passagem indica que todo o grupo de indivíduos que são ressuscitados na primeira ressurreição é ressuscitado junto no início do milênio e reinará juntamente com Cristo pela totalidade dos mil anos (Ap 20.4-6). Isso fica claro a partir da gramática da passagem.[8] No entanto, de acordo com a visão de que a primeira ressurreição é igual à regeneração, os crentes são regenerados ao longo dos mil anos (que é visto como a era atual), de modo que a entrada dos santos neste reinado é distribuída ao longo do milênio. Isso simplesmente não se encaixa com a visão de João como ele a descreve.

Por último, de acordo com a visão de que a primeira ressurreição [supostamente] se refere à regeneração, os indivíduos descritos no versículo 4 são regenerados pelo Espírito Santo só depois de terem sido martirizados. Desta forma, a visão da regeneração introduz “a absurda idéia de haver almas sendo regeneradas depois de terem sido decapitadas por sua fidelidade a Cristo!”[9]

Em contraste com isto, há várias razões óbvias pelas quais a “primeira ressurreição” se refere a uma ressurreição física: (1) Isto é coerente com o uso da palavra “ressurreição” (anastasis), que se refere à ressurreição física em quarenta e uma das quarenta e duas vezes no Novo Testamento; (2) a palavra traduzida como “reviveram” (ezêsan) refere-se ao mesmo tipo de ressurreição, tanto no versículo 5 como no versículo 4 – uma ressurreição física; (3) isso explica perfeitamente o uso da terminologia “primeira ressurreição”, o que implica, obviamente, uma segunda ressurreição, a ressurreição dos ímpios, mil anos mais tarde; e (4) isso se encaixa com o contexto em que João vê aqueles que foram mortos no âmbito físico voltando à vida no âmbito físico.

A objeção mais comum à visão do Premilenismo Futurista de duas ressurreições físicas em Apocalipse 20 é que em outros lugares a Bíblia ensina uma única ressurreição geral, em que os justos e os ímpios serão ressuscitados ao mesmo tempo (Dn 12.2; Jo 5.28-29; At 24.15), conforme um posmilenista pergunta: “Por que deveríamos acreditar que o Novo Testamento ensina, em todos os lugares, uma ressurreição singular geral no último dia, apenas para descobrir, mais tarde... que há, na verdade, duas ressurreições específicas, largamente separadas para diferentes classes de pessoas?”[10]

Em resposta a esta objeção, Daniel 12.2, João 5.28-29 e Atos 24.15, na verdade, não excluem a possibilidade de duas ressurreições distintas e separadas por um período de tempo. De fato, todas as três passagens falam de uma ressurreição dos justos e uma ressurreição de iníquos – e sempre nessa mesma ordem (a mesma de Apocalipse 20) – e elas não afirmam nem exigem que as duas ressurreições aconteçam ao mesmo tempo.[11]

É útil lembrar que revelações posteriores na Escritura irão às vezes esclarecer que há realmente um intervalo de tempo que separa dois eventos previstos em revelações anteriores – dois eventos que inicialmente pareciam que ocorreriam ao mesmo tempo. Por exemplo, não há nenhuma evidência clara no Antigo Testamento em si de que haveria duas vindas distintas do Messias, separadas por um período de tempo significativo. Mas, quando você vem para a revelação posterior, no Novo Testamento, você percebe que aquilo que os escritores do Antigo Testamento pareciam retratar como um único evento deve, agora, ser reconhecido como envolvendo dois eventos. Da mesma forma, quando se trata de ressurreição futura, o que os escritores anteriores da Escritura parecia retratar como uma única ressurreição (a ressurreição geral dos justos e dos ímpios) deve agora ser reconhecido como envolvendo duas ressurreições (a ressurreição dos justos e, em seguida, a ressurreição dos ímpios mil anos depois).

Para ilustrar, imagine-se dirigindo por uma estrada no deserto. Ao longe você vê duas montanhas no horizonte e a rodovia passando bem no meio delas. As duas montanhas parecem estar bem do lado uma da outra, uma à esquerda e outra à direita. Porém, à medida que você se aproxima, você vê que a da direita está, na verdade, mais próxima do que a outra à esquerda. De fato, à medida que você dirige e passa pela montanha da direita, você descobre que há uma lacuna de mil metros entre as duas montanhas ---- uma lacuna que você não podia ver ao olhar de longe.

Isso é exatamente o que você descobre no progresso da revelação com a futura ressurreição dos justos e ímpios. Mais cedo, na Escritura, você vê uma ressurreição de vida e uma ressurreição de julgamento, mas, de longe, parece inicialmente que as duas vão ocorrer ao mesmo tempo (Dn 12.2; Jo 5.28-29; At 24.15). Mas agora você está mais perto e, olhando para o ensino claro de Apocalipse 20, você percebe que, assim como havia mil metros separando as duas montanhas, assim há mil anos separando as duas ressurreições. Esta é a única maneira de harmonizar tudo o que a Escritura ensina sobre o tema da futura ressurreição.


A DURAÇÃO DOS MIL ANOS
O reinado de Cristo em Apocalipse 20 é frequentemente denominado de Seu reino milenar, pois ele é descrito como tendo mil anos de duração. Amilenistas e Posmilenistas geralmente dizem que, em coerência com a natureza simbólica do Apocalipse como um todo, os mil anos devem ser entendidos simbolicamente ou representando um período “completo” de tempo, ou, ainda, significando um período indefinidamente longo de tempo. Isso suscita a questão: os mil anos de Apocalipse 20 devem ser entendidos literalmente ou figurativamente? A importância desta questão é óbvia: se os mil anos são literais, eles não podem se referir à era atual, que já dura quase dois mil anos, e, portanto, deve se referir a um período de tempo que está ainda no futuro.

O principal argumento usado para o ponto de vista simbólico é que o livro de Apocalipse está repleto de simbolismo, em geral, e de números simbólicos, em particular. Por isso, é dito que o número “mil” deve ser simbólico também. Este argumento, no entanto, é demasiadamente simplista. A realidade é que a vasta maioria dos 254 números do livro do Apocalipse devem ser entendidos literalmente. Além disso, toda vez que um número é usado com um indicador de tempo em Apocalipse – tais como dias, meses ou anos – não há nenhuma indicação de que ele seja simbólico. Ademais, em nenhum lugar das Escrituras – nem mesmo em 2Pedro 3.8 – mil anos é usado como uma designação simbólica.[12]

Não é suficiente meramente dizer que Apocalipse está repleto de simbolismo e concluir, com isto, que os mil anos devem ser simbólicos. É necessário fornecer evidências convincentes de que eles devem ser entendidos desta forma. A única abordagem concebível para a compreensão de literatura de qualquer tipo é assumir o sentido literal, a menos que a natureza da linguagem force o leitor a considerar uma interpretação simbólica.[13] Esta não somente é a única abordagem concebível, como também reflete o fato de que a linguagem simbólica do texto leva a um afastamento da literal, e não vice-versa.

Para determinar se algo nas Escrituras deve ser interpretado simbolicamente, é útil fazer três perguntas. Primeiro, será que isto possui um grau de absurdidade quando tomado literalmente? Com a linguagem simbólica, há algo inerente à própria linguagem que obriga o intérprete a olhar para além do significado literal. Este algo é um grau de absurdidade que faz o intérprete coçar a cabeça e dizer: “Mas como pode ser isso?”. Em segundo lugar, será que isto possui um grau de clareza quando tomado simbolicamente? A linguagem simbólica é essencialmente clara e compreensível, retratando vividamente aquilo que ela simboliza. Por esta razão, interpretar a linguagem figurativa simbolicamente traz clareza para o significado de um texto que parecia ser absurdo quando tomado literalmente. E em terceiro lugar, será que isto se encaixa em uma categoria estabelecida de linguagem simbólica? Pelo fato das figuras de linguagem serem afastamentos legítimos do uso normal (literal) da linguagem, eles são limitados em número e podem ser definidos de acordo com exemplos conhecidos.[14] Por esta razão, o intérprete deve determinar se a linguagem em questão cai [de fato] em uma categoria estabelecida de linguagem figurada, tais como símile, metáfora, hipérbole, personificação ou antropomorfismo.

Por exemplo, quando Isaías 55.12 se refere à árvores do campo batendo palmas, a linguagem do teto cumpre todos os três critérios para a linguagem simbólica: 1) ela possui um grau de absurdidade quando tomada literalmente (árvores não possuem mãos); 2) ela possui um grau de clareza quando tomada simbolicamente (ela comunica claramente um momento de tamanha alegria que até mesmo as árvores batem palmas); e 3) ela se encaixa em uma categoria estabelecida de linguagem simbólica (personificação – na qual uma ação humana é atribuída a um objeto inanimado).

Em contraste, os mil anos de Apocalipse 20 não atendem a nenhum dos critérios propostos acima. Em primeiro lugar, não há nada de absurdo ou sem sentido com a interpretação literal dos mil anos que obriga o intérprete a buscar algo diferente do significado literal. Na verdade, se Deus quer comunicar que o reinado de Cristo irá durar mil anos literais, de que outra forma Ele poderia tê-lo feito? O que mais Ele poderia ter dito?

Em segundo lugar, não existe sequer um grau de clareza no texto quando o mesmo é tomado simbolicamente. Por exemplo, um Posmilenista descreve o significado simbólico dos mil anos assim: “O número sagrado, sete, em combinação com o número igualmente sagrado, três, forma o número de santa perfeição [dez], e quando este dez é elevado ao cubo para mil, [João] diz tudo que ele poderia dizer para transmitir às nossas mentes a idéia de plenitude absoluta”.[15] Mas o que exatamente levaria o intérprete a ver estes tipos de equações matemáticas por detrás do número mil? Além disso, a explicação comum de que os mil anos representam “plenitude” ou “um período de tempo completo” suscita a questão: O que exatamente é esta plenitude? O que é um período de tempo completo e como é que isto se difere de um período de tempo incompleto? O que exatamente está sendo comunicado pelas palavras “mil anos”? A maioria das explicações simbólicas dos mil anos introduz mais confusão do que clareza.

Terceiro, o uso simbólico dos mil anos não se enquadra em nenhuma categoria clara de linguagem simbólica. A possibilidade mais próxima parece ser a sugestão de que a interpretação simbólica dos mil anos é como a declaração: “Eu já lhe disse um milhão de vezes”.[16] Esta figura de linguagem é conhecida como hipérbole, um exagero óbvio para enfatizar um ponto. Mas o uso de João de mil anos não pode ser entendido como uma hipérbole se estiver sendo usado para se referir a um período de tempo que já tem quase dois mil anos de duração! O número 1.000 não é um exagero do número 2.000.

Não há simplesmente nenhuma razão convincente no contexto imediato do texto para interpretar os mil anos como outra coisa senão mil anos literais. Na verdade, quando o apóstolo João tem a intenção de expressar uma quantidade indefinida de algo em Apocalipse 20, ele não faz isso nomeando um número específico, como no caso dos mil anos, mas sim usando expressões indefinidas, tais como “pouco tempo” (20.3) ou “o número dessas é como a areia do mar” (20.8). O uso sêxtuplo de João do específico número mil – em contraste com essas frases indefinidas para tempo e números – só corrobora a conclusão de que os mil anos de Apocalipse 20 é literal.


A CRONOLOGIA DAS VISÕES DE JOÃO
O cerne do debate sobre o momento do milênio é, no fim das contas, encontrado na relação cronológica entre Apocalipse 19 e Apocalipse 20. A maioria dos intérpretes concorda que as visões em Apocalipse 19.11-21 retratam a segunda vinda de Cristo. Por esta razão, se a visão em Apocalipse 20.1-6 é destinada a retratar o que acontece em seguida – após a segunda vinda – então, obviamente, os mil anos são ainda futuros e o livro do Apocalipse ensina o Premilenismo.

Em contraste com a leitura cronológica de Apocalipse 19 e 20, o Amilenismo e o Posmilenismo asseveram que Apocalipse 20.1 recapitula e leva o leitor de volta para o início da era presente. Desta forma, diz-se que os mil anos não são futuros, mas presentes, estendendo-se desde a primeira vinda de Cristo até o tempo da Sua segunda vinda. Esta é muitas vezes referida como a perspectiva da recapitulação. A questão é: será que existem razões para crer que Apocalipse 20.1 leva o leitor de volta ao começo da era atual?

O argumento mais comum para a recapitulação vem de Apocalipse 12. De acordo com a perspectiva da recapitulação, os paralelos entre a expulsão de Satanás em Apocalipse 12.7-12 e a expulsão de Satanás em Apocalipse 20.1-6 confirmam que ambas as passagens retratam os mesmos eventos na era atual. Por exemplo, ambos ocorrem em uma cena celestial; ambos envolvem uma batalha angelical com Satanás; ambos se referem a ele como o dragão e a antiga serpente; ambos o retratam sendo lançado para baixo; e ambos se referem ao seu “pouco” tempo. Estes e outros paralelos são citados por Amilenistas e Posmilenistas como prova de que Apocalipse 20.1 leva o leitor de volta para o início da era do Novo Testamento.[17]

O problema é que este argumento se concentra em pontos superficiais da semelhança entre Apocalipse 12 e Apocalipse 20, ignorando diferenças entre as duas passagens que tornam impossível que elas estejam descrevendo os mesmos eventos ou período de tempo. Suponha que uma revista publicasse dois artigos distintos sobre o presidente dos Estados Unidos. O primeiro artigo descreveu como ele voou no Air Force One de Washington, DC, para Londres, onde ele passou o dia dando uma série de discursos públicos. Um artigo subseqüente descreveu como ele voou no Air Force One de Londres para o Havaí, onde ele passou duas semanas de férias com sua família fora do olhar público. O leitor perspicaz não diria que os dois artigos estavam descrevendo o mesmo vôo simplesmente porque ambos se referiram à como (a) o presidente dos Estados Unidos (b) voou através do oceano (c) no Air Force One. Afinal de contas, o ponto de partida é diferente, o destino é diferente e a essência da viagem é diferente. Os dois relatos não poderiam estar descrevendo o mesmo vôo através do oceano.

Assim é com os paralelos entre Apocalipse 12 e Apocalipse 20: apesar de ambas as passagens se referirem à expulsão de Satanás, diferenças críticas excluem a possibilidade de que elas se refiram à mesma expulsão. Por exemplo, em Apocalipse 12, Satanás é lançado para baixo do céu à terra, mas em Apocalipse 20 Satanás é lançado para baixo da terra em direção ao abismo. A menos que alguém esteja pronto a equiparar o abismo e a terra, isto não pode ser a mesma expulsão de Satanás. Ele está na terra em Apocalipse 12 e no abismo em Apocalipse 20, mas ele não pode estar em dois lugares ao mesmo tempo.

Outra grande diferença é que a expulsão de Satanás do céu em Apocalipse 12 tem o efeito oposto ao da expulsão de Satanás para o abismo em Apocalipse 20. Quando Satanás é lançado para a terra no capítulo 12, isso resulta em aumento do engano das nações (Ap 12.9).[18] Mas quando Satanás é lançado no abismo em Apocalipse 20, isto o impede de continuar a enganar as nações (Ap 20.3). Satanás pode estar enganando as nações do mundo ou pode estar selado no abismo e incapaz de enganar as nações, mas ele não pode estar enganando e sendo incapaz de enganar ao mesmo tempo. As duas descrições supracitadas são incompatíveis.

A diferença final envolve o curto espaço de tempo dado a Satanás em ambas as passagens. No final de Apocalipse 12.12, João descreve Satanás sendo lançado na terra, “cheio de grande cólera, sabendo que pouco tempo lhe resta”. Já em Apocalipse 20.3, João escreve que, após Satanás ser trancado no abismo por mil anos, “é necessário que ele seja solto por um pouco de tempo”. Este paralelo – “pouco tempo” em 12.12 e “pouco tempo” em 20.3 – é citado por aqueles que tentam defender a prespectiva da recapitulação. O problema é que estes dois períodos de tempo não se alinham cronologicamente. Em Apocalipse 12, Satanás é lançado na terra por pouco tempo, mas em Apocalipse 20 ele é lançado no abismo por um longo tempo (os mil anos), e, só depois, ele é solto por um pouco de tempo. Se a perspectiva da recapitulação estivesse correta, o curto período de tempo em Apocalipse 12 coincidiria com o longo tempo (mil anos) em Apocalipse 20, que é seguido por um curto período de tempo. O suposto paralelo entre o “pouco tempo” em Apocalipse 12 e o “pouco” em Apocalipse 20 não oferece suporte algum para a perspectiva da recapitulação e, na verdade, representa um problema para ela.

Em contraste com a perspectiva da recapitulação, a maneira mais natural de ler esta seção de Apocalipse é ver uma relação seqüencial na qual os eventos do capítulo 20 seguem os do capítulo 19. Não há nada em Apocalipse 20.1 que indique uma ruptura cronológica entre os dois capítulos – João simplesmente apresenta a próxima visão com as palavras “Então, vi”, assim como ele faz por todo o livro de Apocalipse. Na ausência de qualquer indicação clara de que Apocalipse 20.1 leva o leitor de volta ao começo da era atual, é melhor para afirmar uma relação cronológica.

Além disso, a perspectiva seqüencial de Apocalipse 19 e 20 é apoiada por uma série de características no contexto imediato. Em primeiro lugar, a referência de João de como a prisão de Satanás fará com que ele “não mais” engane as nações (Ap 20.3) liga esta visão ao contexto anterior de uma forma que sugere uma relação claramente seqüencial. Pelo fato de as palavras “não mais” indicarem que Satanás estava envolvido neste engano pouco antes de ser trancado no abismo – e pelo fato de Apocalipse 12 e 19 destacar repetidamente o engano satânico das nações que ocorrerá ao longo da segunda metade da tribulação (Ap 12.9; 13.14; 16.14; 18;23; 19.19-20) – esta referência a Satanás “não mais” enganar as nações durante os mil anos aponta para uma leitura cronológica de Apocalipse 19 e 20. Isto seria semelhante a uma narrativa que contivesse vários capítulos que descreve como um cão latia para um gato, seguido por um capítulo que, então, descrevia como um homem trancou o cão na garagem “para que ele não mais latisse para o gato”. A forma mais natural de ler tal narrativa seria ver este último capítulo como descrevendo um evento que ocorreu subsequentemente aos eventos descritos nos capítulos anteriores.

Em segundo lugar, a descrição do lago de fogo em Apocalipse 20.10 também sugere uma relação seqüencial. No tempo da segunda vinda, antes dos mil anos, a besta e o falso profeta serão “lançados vivos no lago de fogo que arde com enxofre” (Ap 19.20). Então, no final dos mil anos, Satanás será “lançado para dentro do lado de fogo e enxofre, onde já se encontram não somente a besta como também o falso profeta” (Ap 20.10; itálico adicionado). À luz desta descrição, a maneira mais natural de ler Apocalipse 19-20 é ver uma sequência cronológica em que (1) a besta e o falso profeta são lançados no lago de fogo (Ap 19.20); (2) Satanás está preso e selado no abismo por mil anos (Ap 20.1-6); (3) Satanás é solto após os mil anos e derrotado pelo fogo do céu (Ap 20.7-9); e depois (4) Satanás é lançado no lago de fogo onde a besta e o falso profeta já estão (Ap 20.10).

Em terceiro lugar, o conteúdo de Apocalipse 20.1-6 é simplesmente incompatível com a visão de que esta passagem supostamente seja uma descrição da era atual. O aprisionamento de Satanás é futuro e não presente; a “primeira ressurreição” é física e não espiritual; e os mil anos são literais e não simbólicos. Por estas razões óbvias, o conteúdo da visão de João em Apocalipse 20.1-6 não admite a perspectiva da recapitulação e os eventos de Apocalipse 20 seguem [naturalmente] os de Apocalipse 19.


CONCLUSÃO
A divergência sobre o milênio provavelmente continuará por algum tempo, mas não por causa de uma falta de clareza em Apocalipse 20.1-6. Qualquer tentativa de argumentar a favor do Amilenismo ou Posmilenismo subestima a contribuição desta passagem ou rejeita a sua interpretação direta. Quando Cristo voltar à terra em glória, Satanás será lançado no abismo e lá confinado por mil anos. Durante este tempo, o Senhor Jesus estabelecerá o Seu reino milenar e reinará de Jerusalém em perfeita paz e justiça. Então, na conclusão dos mil anos, Satanás será solto do abismo, decisivamente derrotado, e lançado no fogo. Os ímpios serão julgados, a Terra será destruída, e novos céus e terra serão estabelecidos e continuarão por toda a eternidade. E desta forma, quando tudo houver sido dito e feito, o Senhor Jesus será vitorioso sobre tudo o que é mal.

– Matthew Waymeyer / Os Planos Proféticos de Cristo: Um guia básico sobre o Premilenismo Futurista – John MacArthur & Richard Mayhue – Cap. 6, Pág. 119-133.

SUMÁRIO: Os Planos Proféticos de Cristo

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